Nem sempre é o bastante

Nem sempre é o bastante

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

A resposta de um colega hoje em no grupo de e-mails de DPU me fez elaborar uma coisa sobre a qual reflito já há algum tempo.

Por um lado, o trabalho na Defensoria Pública, em meu sentir, é aquele, dentre as carreiras jurídicas, que dá a resposta mais rápida e satisfatória. Conseguir um medicamento, um benefício previdenciário, uma matrícula em uma escola para uma pessoa que não teria a quem recorrer e que vê, em um período às vezes curto de tempo, a solução chegar, de forma inteiramente gratuita, é extremamente gratificante.

Isso pessoaliza o trabalho. Dá a ele uma feição, um rosto, uma voz, uma história. Claro que defender a sociedade ou o Estado são coisas fundamentais, mas menos individualizadas, mais distantes.

Todavia, em um sentido diferente daquele em que a expressão é usualmente empregada, às vezes em me sinto a enxugar gelo. O termo normalmente é usado para um trabalho exaustivo e interminável. No meu caso, não que ele não o seja, mas sempre penso em como seria possível mudar mais a situação das pessoas atendidas além de obter em seu favor uma decisão, para que a sucessão de necessidades e misérias não as faça sucumbir.

Explico. Como falei acima, comentei no grupo de e-mails da DPU a longa batalha até a concessão da ordem, pelo STJ, em favor de um assistido, narrada em uma postagem de nome: “Um longo caminho”[1]. Em resumo, foi concedida a desinternação em favor do paciente do habeas corpus, assistido pela Defensoria Pública, trancafiado há tempos em uma Instituição.

Meu colega então respondeu dizendo esperar que ele não se tornasse um morador de rua, sujeito a todo tipo de violência e abandono.

Pensei, é bem possível que aconteça, mas deveríamos deixá-lo preso para sempre?

Isso me fez lembrar de um habeas corpus que acompanhei no STF em que o paciente era acusado de furtar um par de tênis baratos, em uma grande loja de Belo Horizonte. Ele, morador de rua, já tinha contra si várias acusações de furto.

Perseguido logo após a subtração, ele foi preso, sendo recuperado o bem. Ao ser perguntado se estava arrependido da prática, respondeu:

“Não, não aguentava mais andar descalço.”

Ao ler o processo, pensei quantos pequenos furtos ele teria praticado já depois daquele, pois as necessidades básicas voltam todos os dias. Em suma, ainda que ganhasse o HC do tênis, o que isso resolveria?

Brasília, 11 de novembro de 2017

[1] https://gustavoalmribeiro.wordpress.com/2017/10/11/um-longo-caminho/

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