Sobre temas discutidos no twitter (execução penal e tráfico de drogas)
Gustavo de Almeida Ribeiro
Nem sempre é fácil explicar as coisas nos limitados caracteres do twitter, mesmo usando o recurso de mandar vários em seguida.
Hoje, participei de um questionamento e fui perguntando em outro, sobre dois temas envolvendo direito penal.
Respondo aqui brevemente.
Execução penal, progressão e o Informativo 832 do STF
O Informativo 832 do STF noticiou o julgamento de dois agravos em 2 execuções penais oriundas da ação penal 470, o famoso “mensalão”.
Alguns cuidados devem ser tomados por quem estuda esses precedentes.
Em primeiro lugar, alguns dos crimes imputados aos acusados na citada ação, ocorreram antes da vigência da Lei 10.763/03 que alterou tanto o artigo 33 do CP, a ele acrescendo o §4º, impondo a reparação do dano nos crimes contra a administração pública para a progressão de regime, quanto o preceito secundário dos crimes de corrupção passiva e ativa. Por outro lado, outras condutas já foram posteriores, aplicando-se a elas a novel redação do Código Penal.
Em seguida, pelo que sei, nem todas as acusações foram por crimes contra a administração pública, de forma a incidir o §4º do artigo 33 do CP àqueles praticados após a Lei 10.763/03. Houve acusações sobre as mais variadas condutas.
E, segundo entendo, a exigência do STF, além da reparação do dano, foi o pagamento da multa, ainda que parcelada, ou a demonstração da impossibilidade de fazê-lo. Multa e reparação do dano não se confundem. A leitura do acórdão do EP 12 Prog Reg-AgR parece deixar isso bem claro, ao dizer que a multa pode ser dispensada em caso de falta de condição, a reparação do dano, não:
“25. A exceção admissível ao dever de pagar a multa é a impossibilidade econômica absoluta de fazê-lo. Aqui, diferentemente do que assentei em relação ao crime de peculato no precedente já referido (EP 22-AgR, caso João Paulo Cunha) – em que a restituição do dinheiro desviado se mostrou imperativa para a obtenção do benefício –, é possível a progressão se o sentenciado, veraz e comprovadamente, demonstrar sua absoluta insolvabilidade. Absoluta insolvabilidade que o impossibilite até mesmo de efetuar o pagamento parcelado da quantia devida, como autorizado pelo art. 50 do Código Penal (“o juiz pode permitir que o pagamento se realize em parcelas mensais”). (EP 22 AgR, Relator Ministro Roberto Barroso, Pleno, julgado em 17/12/2014)
Assim, pelo que entendi, a discussão ocorrida na EP 8 Prog Reg-AgR, noticiada no Informativo 832/STF, foi sobre a necessidade do pagamento de multa para a progressão de regime, não versando sobre reparação do dano.
Tráfico, quantidade de droga e hediondez
Esse tema acaba sendo resolvido caso a caso, mas algumas balizas podem ser fixadas, segundo o entendimento prevalecente do STF.
O tráfico privilegiado não é hediondo (aquele em que incide a minorante do artigo 33, §4º da Lei 11.343/06). O HC 118.533, julgado pelo Plenário do STF, continua a ser o paradigma quanto a isso.
O processo escolhido (HC 118.533) e levado ao Pleno para a discussão da hediondez quase nos fez perder a tese em decorrência da quantidade de droga transportada pelos pacientes. Todavia, o que verdadeiramente importava no caso é que as instâncias ordinárias já tinham reconhecido a aplicação da causa de redução de pena para o chamado pequeno traficante. Ou seja, a discussão não era mais essa e sim se, reconhecida essa condição, poderia ser afastada a hediondez da conduta.
Na maioria das vezes, a aplicação ou não da minorante deve ser decidida pelas instâncias ordinárias, por demandar, segundo o STF, revolvimento fático-probatório.
Há situações excepcionais, contudo. Por exemplo, o mero afastamento da redutora pela condição de mula do acusado, sem qualquer indício de habitualidade delitiva.
Em resumo, aplicada a redução de pena do §4º do artigo 33 da Lei 11.343/06, o tráfico não será hediondo, esse era o cerne do HC 118.533.
A mera quantidade de droga não determina que a redutora será ou não afastada. Todavia, a depender da quantia, ela pode ser um indicativo de habitualidade (nem sempre, por óbvio).
Brasília, 30 de outubro de 2016