Eu queria voltar a ser ouvido
Gustavo de Almeida Ribeiro
São cada vez mais comuns os julgamentos monocráticos dos habeas corpus e dos recursos ordinários em habeas corpus, por parte dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, em detrimento dos julgamentos colegiados[1].
Em caso de inconformidade da parte, resta a possibilidade do agravo interno, julgado em meio virtual ou em lista.
Sei que essa medida decorre da profusão de habeas corpus impetrados diariamente no STF, todavia, cabe tecer algumas considerações que vão além dos números.
Em primeiro lugar, muitas ações constitucionais que chegam ao Supremo não têm qualquer chance de prosperar: não estão instruídas, voltam-se contra autoridades coatoras cujo julgamento não cabe ao Tribunal ou, ainda, são incompreensíveis. Tais processos fazem volume, mas são resolvidos rapidamente.
Além disso, compreendo que temas estritamente de direito, com pouca influência da situação fática em questão, possam ser apreciados de forma monocrática, desde que a matéria neles veiculada já esteja consolidada.
Todavia, o que tenho notado recentemente é a opção pelo julgamento monocrático em temas ainda não pacificados e, pior, por vezes, para se chegar à resultados distintos do precedente firmado por um colegiado.
Se o julgamento em lista que advém da interposição do agravo já não é o ideal, aquele que ocorre em ambiente virtual torna-se ainda mais questionável.
A situação fica pior ao se indeferir pedido de retirada do julgamento do sistema virtual, passando-o para a forma presencial, sob o fundamento de que o tema está consolidado sem, para tanto, se indicar um precedente sequer.
Patrocino uma série de HCs e RHCs perante o Supremo Tribunal Federal já há bastante tempo, pelo que vivenciei de perto as mudanças ocorridas na Corte. Como falei, sou capaz de compreender algumas, mas, penso que outras são exageradas e, pior ainda, por vezes, geram sensação de tratamento diferenciado.
A cada semana que passa existem cada vez menos processos julgados de forma presencial e colegiada no que respeita à Defensoria Pública da União. Cheguei a ver quase vinte serem julgados em uma só sessão da Segunda Turma, enquanto hoje, muitas sessões não têm sequer um, apesar do grande número de impetrações com temas diversos.
Com mais de dez anos de militância perante a Corte, posso dizer com tranquilidade da enorme diferença entre o julgamento original, em que a defesa, se entender necessário, pode usar da palavra, do mero julgamento de agravo. Nunca virei um agravo interno contra o voto do Ministro relator; em julgamentos diretos, já ganhei vários após a sustentação oral contra o voto do relator original.
Não pretendo e, em verdade, nunca agi assim, sustentar em todos ou em uma profusão de feitos, mas gostaria de poder falar em algumas situações recorrentes ou cuja interpretação do STF precisa ser repensada. Muitas vezes, quando sustento um habeas corpus, estou falando por milhares de pessoas, vide as questões envolvendo execução penal, relevantes para um sem número de casos.
Aliás, o Tribunal tem adotado a postura de pedir a dispensa da sustentação oral quando vai conceder a ordem. Claro que consinto, sem, contudo, deixar de lamentar em certas oportunidades, uma vez que sustento a tese.
Ainda não vislumbrei solução, sendo o presente apenas um lamento, de qualquer modo, não desisti de pensar, nem de incomodar. Muitos dependem disso.
Brasília, 22 de setembro de 2017
[1] Exceção feita ao Ministro Marco Aurélio que não adota a prática dos julgamentos monocráticos.