Em defesa dos mais frágeis

Em defesa dos mais frágeis

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

A Segunda Turma do STF negou provimento, na sessão de 05/12/2017, ao agravo interno interposto pela assistida da Defensoria Pública da União contra decisão monocrática do Ministro Dias Toffoli, relator do HC 145485, que havia negado seguimento ao writ por entender que a impetração voltava-se contra decisão monocrática de Ministro de Corte Superior, pelo que não teria sido esgotada a instância antecedente.

O tema de fundo do mencionado habeas corpus é dos mais relevantes, pelo que formalidades, notadamente em se tratando de uma ação cujo objetivo é a tutela do direito de locomoção, deveriam ser deixadas em segundo plano.

A paciente tem contra si duas condenações em primeiro grau por tráfico de drogas, que totalizam 12 anos e 7 meses de reclusão em regime fechado, ambas em fase de recurso.

Discutia-se, no caso, a possibilidade de concessão de prisão domiciliar à paciente do HC em questão, que, quando da impetração, bem como da decisão singular no STF, estava grávida.

Durante o trâmite processual ela veio a dar à luz, sendo mantida, até a presente data, em estabelecimento prisional no Estado do Paraná.

Dois foram os fundamentos, pelo que entendi do julgamento, uma vez que ainda não foi publicado o acórdão, invocados pela Turma para se manter a decisão agravada: a supressão de instância e a adequação do estabelecimento em que se encontra a agravante.

O autor do presente, que acompanhou todo o trâmite do writ após sua impetração junto ao STF, feita por um colega, agravou da decisão monocrática, apresentou memorial, acompanhou a sessão e pediu destaque no julgamento. Em suma, o processo foi cuidado de perto.

A impetração no STJ não fora conhecida em razão de a matéria não ter sido apreciada pelo Tribunal de Justiça do Paraná. Segundo a decisão proferida naquele Tribunal, teria havido supressão de instância.

Cumpre, todavia, tecer algumas considerações. O habeas corpus foi impetrado de forma manuscrita na Corte Superior. Intimada a Defensoria Pública da União, foi apresentada manifestação em favor da paciente em que se pediu expressamente a concessão da prisão domiciliar.

De nada adianta a aceitação de pedidos feitos de próprio punho se, mesmo diante de ilegalidades claras e da complementação técnica feita pela Defensoria, questões processuais forem invocadas para não se adentrar no mérito, principalmente em discussões de tamanha relevância.

Por outro lado, não se nega que a impetração perante o STF deu-se contra decisão singular. Todavia, sequer se trata de invocação do verbete da súmula 691 da Corte, uma vez que não se discutia indeferimento de mera liminar. A urgência na apreciação do pedido parece saltar aos olhos.

Em resumo, cuidando-se de gestante ou mãe de recém-nascido, questões processuais em uma das mais democráticas formas de acesso à Justiça deveriam ser colocadas em segundo plano, enfrentando-se o mérito.

Já no que concerne ao tema de fundo, a solução encontrada também não foi a melhor, com o devido respeito. Quando indeferido o pedido pelo Ministro Dias Toffoli, faltava uma semana para a paciente dar à luz. Ela continua recolhida. Entendeu-se, no julgamento do agravo, que o presídio onde se encontra mantém condições adequadas para mãe e bebê. Todavia, informações prestadas pelo Juízo de origem esclarecem, conforme documento extraído dos autos eletrônicos do HC 145485:

“Em diversas inspeções realizadas por este juízo junto à Penitenciária Feminina do Paraná (PFP) constatei que todas as crianças possuem os cuidados necessários para seu desenvolvimento físico, psíquico e emocional dentro da creche “Cantinho Feliz”, local separado das celas aonde as mães dormem”. (trecho do ofício da lavra do Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais de Curitiba/PR) grifo nosso

Em suma, as mães não podem dormir próximas a seus filhos. A presença da mãe é essencial para uma criança de tão tenra idade. As demandas dos recém-nascidos (o bebê nasceu preso) não têm hora, pelo que a simples separação do filho e da mãe durante o período noturno deveria ser considerado. A situação fica ainda mais díspar se comparada com domiciliares recentemente concedidas pelos Tribunais pátrios.

Confesso ter ficado bastante decepcionado com o desfecho. Há várias decisões concedendo recolhimento domiciliar mesmo em caso de supressão de instância. Também não faltam pessoas condenadas a penas ainda maiores que as da paciente respondendo soltas a seus processos. Não se trata de direito absoluto, é bem verdade, mas aspectos processuais e um presídio que deixa um recém-nascido longe da mãe durante a noite não me parecem motivos para afastá-lo.

Brasília, 10 de dezembro de 2017