A compatibilidade entre o sursis e o indulto

A compatibilidade entre o sursis e o indulto

 

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal está discutindo se o tempo em que o apenado cumpriu período de prova do sursis pode ser considerado para a obtenção de indulto, nos termos do disposto no inciso XIII do artigo 1º do Decreto 8.172/2013. São quatro habeas corpus em julgamento sobre o tema, três com pacientes militares e um com paciente civil. Segue, abaixo, memorial por mim apresentado antes do início do julgamento de um desses feitos, com breves considerações sobre o sursis, a competência da Justiça Militar e a desatualização da legislação penal e processual penal militar em relação à legislação penal comum.

 

  1. BREVE NARRAÇÃO DOS FATOS

O paciente foi denunciado pela suposta prática do delito tipificado no artigo 299 do Código Penal Militar, desacato, à pena de 6 (seis) meses de detenção, sendo a ele concedido regime inicial aberto e o benefício do sursis pelo prazo de 2 (dois) anos.

O apenado XXXX vem cumprindo regularmente todas as condições impostas.

Em 19 de fevereiro de 2014, em decorrência do Decreto presidencial de indulto de dezembro de 2013, o Juiz Auditor da 3ª Auditoria da 1ª CJM proferiu decisão reconhecendo que o paciente atendeu os requisitos subjetivos e objetivos para a concessão do indulto especificados no inciso XIII do artigo 1º do Decreto 8.172/2013, vez que cumpriu ¼ (um quarto) do período de prova do sursis dentro do prazo especificado no decreto presidencial.

Contra esta decisão, o Parquet interpôs recurso em sentido estrito, argumentando que o período de prova do sursis não pode ser contabilizado como tempo de cumprimento de pena.

No dia 25 de junho de 2014, foi a Plenário o julgamento do recurso, interposto pelo Ministério Público Militar, oportunidade em que, por unanimidade, o Superior Tribunal Militar deu-lhe provimento e reformou a decisão de primeiro grau.

Entretanto, conforme será demonstrado a seguir, tal entendimento não deve prosperar.

2. DOS FUNDAMENTOS PARA A CONCESSÃO DA ORDEM

A presente impetração traz a oportunidade de a Suprema Corte apreciar diversos temas que afetam a Justiça Militar, principalmente quando são a ela submetidos civis.

Em primeiro lugar, calha rememorar que no caso dos autos, o paciente foi acusado de desacato, crime de duvidosa constitucionalidade.

Em seguida, cabe dizer que o paciente, civil, teria praticado tal conduta contra militares em atividade de policiamento, matéria que foi considerada, no julgamento até agora concluído pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, de competência da Justiça comum (HC 112936, 2ª Turma, Rel. Ministro Celso de Mello, acórdão publicado em 17/05/2013), havendo ainda feito afetado ao Plenário da Corte.

Piora mais ainda a situação o anacronismo da legislação penal e processual penal castrense que se torna mais flagrante a cada dia, vez que não tem sido atualizada e adequada ao disposto na Constituição Federal de 1988, bem como nos tratados de direitos humanos de que o Brasil é signatário. Assim, persistem entendimentos superados nas leis penais comuns, como o tratamento do tráfico e do uso de drogas no mesmo dispositivo legal, bem como a manutenção do interrogatório do acusado no início da instrução, quando o próprio STF já reconheceu, apreciando Ação Penal originária, que a autodefesa é mais bem exercida quando o réu sabe o que foi dito contra si pelas testemunhas no curso da instrução processual (AP 528 AgR, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, Pleno, acórdão publicado em 08/06/2011).

Essa desatualização é ainda mais maléfica ao atingir o civil, pois este, ao contrário daquele que adotou para sua vida a carreira militar, não optou por seguir o estilo de vida castrense, com todas as suas demandas de hierarquia e disciplina, sempre invocadas nos julgamentos envolvendo militares. Por isso, a Suprema Corte deve caminhar no sentido de declarar a impossibilidade de a Justiça Militar processar e julgar civis.

A presente impetração, de certo modo, é consequência desse anacronismo. Como se sabe, a Justiça Militar, como regra, não procede à substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, mesmo que o acusado preencha todos os requisitos necessários – nesse sentido, vide julgados do STF: HC 91709, Rel. Ministra Cármen Lúcia, Primeira Turma, acórdão publicado em 13/03/2009 e HC 94083, Rel. Ministro Joaquim Barbosa, Segunda Turma, acórdão publicado em 12/03/2010. Concede, entretanto, o sursis, suspendendo a pena nos termos do disposto no Código Penal Militar.

Mas até mesmo o instituto da suspensão condicional da pena encontra-se defasado no Código Castrense em relação à Lei Penal comum. Esta, a partir da reforma da Parte Geral do Código Penal de 1984, impôs condições para o recebedor da suspensão muito próximas das penas restritivas de direito. Aliás, o Código Penal estabelece que o sursis será aplicado quando não for possível a substituição da pena pela restritiva de direitos, o que está a indicar ser ele medida mais gravosa, tanto que subsidiária.

Mas é preciso ir além. Desde 1908, muito antes das últimas alterações levadas a efeito pelo reformador de 1984, José Mendes já advertia, em dissertação apresentada em concurso prestado na Faculdade de Direito de São Paulo, conforme menciona René Ariel Dotti em seu artigo “O “sursis” e o livramento condicional nos projetos de reforma do sistema”, pronunciado em conferência ocorrida em 8 de abril de 1983 no I Ciclo de Estudos de Direito e Processo Penal patrocinado pelo Instituto dos Advogados Brasileiros, que o sursis tem nítido caráter penal: “A própria condemnação condicional é uma pena consistente na ameaça feita ao delinquente; é um substitutivo penal, que não perde a natureza de pena. É pena no verdadeiro sentido, o scientífico, É pena adequada ao nosso tempo.” (artigo publicado na Revista Justitia, do Ministério Público de São Paulo, 46(124): 175-194, jan/mar 1984)

O introito acima contextualiza a situação dos beneficiários da suspensão condicional da pena perante a Justiça Militar em cotejo com o disposto no Decreto de Indulto 8.172 de 24 de dezembro de 2013, mais precisamente em seu artigo 1º, XIII.

Inicialmente, questiona-se, se sursis não fosse pena, não fosse gravame, não seria aplicável quando incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e sim preferencialmente. Ou seja, é considerado subsidiário em relação à pena restritiva, pelo que é, logicamente, mais severo, caso contrário, seria aplicado primeiramente a quem fizesse jus aos dois institutos. Em outras palavras, seria ilógico se constatar que alguém não merece a substituição de pena, mas merece o sursis e ao mesmo tempo concluir que este não é pena e a substituição o é. Tal conclusão levaria a uma situação paradoxal de imposição de pena a quem tem condição menos grave e não imposição a quem tem condição mais severa.

A suspensão impõe ao seu recebedor uma ameaça constante de execução da pena em caso de descumprimento das condições impostas. Aliás, mais uma vez, repete o que ocorre com a substituição da pena pela restritiva de direitos, que, não cumprida, é convolada em privativa de liberdade.

Reforça ainda o caráter penal do sursis a necessidade de individualização na sua aplicação que deverá apreciar questões como antecedentes, personalidade, circunstâncias do crime, nitidamente ligadas à dosimetria penal; bem como a exigência de condições específicas a que fica subordinada a suspensão.

Cumpre ainda dizer que a interpretação de que o prazo da suspensão não deve ser considerado para a concessão do indulto parece ser mais rigorosa com quem foi apenado em infração menos grave em relação a quem sofreu punição maior. Aqui, reitera-se o já afirmado acima no sentido de que a Justiça Militar não aplica penas restritivas, situação que culmina na concessão de sursis. Repisa-se, o anacronismo é absurdo contra o militar, inadmissível contra o civil.

As diferenças existentes entre a Lei Penal comum e a Militar agravam-se diuturnamente, na medida em que esta não acompanha as alterações realizadas naquela, em temas que não guardam qualquer relação com a especificidade da vida na caserna. Por isso, é preciso que o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar os feitos oriundos da Justiça Castrense, atente-se para a desatualização da legislação lá aplicada, principalmente, mas não apenas, quando o acusado é civil, que, aliás, sequer deveria ser submetido a julgamento perante as instâncias militares.

Assim, deve ser o tempo de suspensão condicional da pena considerado para a obtenção do indulto, evitando-se a discrepância entre o condenado pela Justiça Militar e a Justiça comum e o tratamento mais gravoso a quem tenha praticado crime de pouca relevância penal.

Aliás, o instituto da suspensão condicional da pena parece ter sido extirpado do projeto de Novo Código Penal, o que está a demonstrar sua defasagem em relação ao sistema penal atual.

3. DO PEDIDO

Portanto, o sursis deve ser considerado, ao menos, como execução parcial da pena, pelo que se justifica que o período de seu cumprimento seja considerado para a obtenção do indulto, com a consequente concessão da ordem.

Nestes termos,

Pede deferimento.

Brasília, 25 de maio de 2015. 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Devolutividade e reformatio in pejus

Devolutividade e reformatio in pejus

Foi publicado, em 8 de maio de 2015, o acórdão do HC 103310, impetrado pela Defensoria Pública da União, versando sobre tema interessante e capaz de gerar divergência.

A discussão veiculada no habeas corpus dizia respeito ao que se entende por reformatio in pejus em recurso exclusivo da defesa, divergindo a Defensoria da decisão que prevalecera até a Corte Superior.

A ordem foi concedida, após empate na votação, pela 2ª Turma do STF (pela concessão: Ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello X pela denegação: Ministros Teori Zavascki e Cármen Lúcia).

O precedente é interessante, pois os Tribunais insistem no entendimento de que sendo a pena final menor que a imposta em primeiro grau, não há reformatio in pejus, mesmo que em determinada fase da dosimetria o Tribunal de apelação piore, em recurso exclusivo da defesa, a situação do acusado/apelante.

Esses casos têm sido recorrentes na atuação da DPU, estando um deles atualmente com vista ao Ministro Gilmar Mendes, já com voto contrário do relator, Ministro Dias Toffoli (RHC 126763).

São várias as situações em que tal efeito pode acontecer. Por exemplo, a apelação da defesa discute a fração da majoração da pena pela internacionalidade no tráfico de drogas, sem nada falar sobre a pena-base, ou, pior ainda, pedindo sua redução. O Tribunal dá provimento ao recurso e diminui a fração de aumento de pena pela internacionalidade, mas, de ofício, aumenta a pena-base fixada, literalmente provendo ao contrário o recurso, sob o fundamento da devolutividade.

Entende-se com frequência que se a pena final for menor que a da primeira instância, não há que se falar em reformatio in pejus. Ora, o prejuízo é óbvio: o Tribunal assume o papel do Ministério Público e, com isso, torna mais pesada a pena em relação ao que ela deveria ser. Se a Corte discorda de alguma fase da dosimetria penal não impugnada pelo Parquet, ela nada pode fazer.

A devolutividade não vai ao ponto de permitir que o Tribunal de apelação aprecie aspecto da sentença não impugnado ou impugnado apenas pela defesa com o escopo de se reduzir a pena, chegando à conclusão pela piora da situação do recorrente naquela fase da dosimetria penal.

A questão é tão sensível e relevante que, há mais de 20 (vinte) anos, ao julgar o HC 71822, relatado pelo E. Ministro Celso de Mello, a 1ª Turma do STF concedeu a ordem por entender que: “O princípio tantum devolutum quantum appellatum condiciona a atividade processual dos Tribunais em sede recursal. Sendo assim, não e licito ao Tribunal, quando do julgamento de recurso interposto pelo Ministério Público, ultrapassar os limites tematicos fixados na petição recursal subscrita pelo órgão da acusação penal. A reforma da sentença, em ponto que não havia sido impugnado pelo Ministério Público, e da qual resulte o agravamento do status poenalis do condenado, por constituir pronunciamento ultra petita não admitido pelo sistema processual, configura situação tipificadora de injusto constrangimento ao status libertatis do paciente.” – trecho extraído da ementa do acórdão, publicado em 4 de novembro de 1994. Ora, se o Tribunal não pode ultrapassar os limites impostos em apelo interposto pelo Ministério Público para agravar a situação do acusado, mais inadmissível ainda é fazê-lo em recurso defensivo, seja porque a matéria não foi tratada ou porque se foi invocada teve como objetivo reduzir a pena, nunca majorá-la.

Calha, por fim, fazer uma observação importante. Em certas circunstâncias, o próprio apelo defensivo pode requerer, por ser mais benéfico, que determinada causa de majoração de pena seja retirada de uma fase da dosimetria e passada para outra. Essa situação não configura reformatio in pejus, mas uma readequação na dosimetria favorável à defesa. Um exemplo ajuda a entender melhor o afirmado. O concurso de pessoas qualifica o furto (CP, artigo 155, §4º, IV), dobrando a pena mínima de 1 (um) para 2 (dois) anos. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, inúmeras vezes, provia recurso defensivo para afastar a qualificadora e considerar o concurso no furto como causa de aumento de pena, tal como ocorre no crime de roubo (CP, artigo 157, §2º, II), sendo que neste a fração de majoração varia de um terço até a metade. Ou seja, o furto deixava de ser qualificado, passando a ser simples, com a qualificadora transformada em causa de aumento de pena, gerando resultado mais favorável ao recorrente, portanto. Tal situação em nada se confunde com a mudança para pior em qualquer fase da dosagem da pena, feita de ofício pelo Tribunal, quando tal alteração vai de encontro ao interesse da defesa em recurso exclusivo seu – vide o exemplo acima em que um apelo defensivo pedindo a redução da fração de aumento de pena pela internacionalidade do tráfico de drogas foi utilizado para majorar a pena-base, sob o fundamento da amplitude da devolutividade.

Como anteriormente afirmado, a questão ainda não está consolidada, mas parece inaceitável que o Tribunal de apelação possa piorar a situação do acusado em determinada fase da dosimetria sem que tenha sido provocado pelo Ministério Público, mesmo que a pena final seja, em termos matemáticos, inferior àquela imposta na sentença recorrida.

Brasília, 9 de junho de 2015

Gustavo de Almeida Ribeiro

Furto, insignificância e um mínimo de razoabilidade

Furto, insignificância e um mínimo de razoabilidade

Temo que ao final do julgamento dos habeas corpus afetados ao Plenário do STF em que se discute a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância ao furto (HC 123734, HC 123533 e HC 123108), tenhamos um resultado bem restritivo, afastando-se o citado postulado de acordo com a vida pregressa do acusado, ou em razão de qualquer qualificadora boba (a presença de 2 pessoas, por exemplo).

Entretanto, alguns julgados recentes do Tribunal mostram que essa vedação absoluta, na prática, vai gerar absurdos que saltam aos olhos de quem tem um mínimo de sensibilidade.

Em 2 de junho do corrente, foi julgado o HC 126866, pela 2ª Turma do STF, em que se discutia o furto de uma peça automotiva no valor de R$ 4,00. O paciente tinha sido condenado pela Justiça Mineira a 2 anos e 4 meses de reclusão, afastada a insignificância por ter ele condenação anterior por fato completamente diverso do furto. A ordem foi concedida por unanimidade pelo colegiado. O relator do feito foi o Ministro Gilmar Mendes.

Há algum tempo atrás, a mesma 2ª Turma do STF deferiu, também por unanimidade, o HC 117903, em que se discutia a aplicação da insignificância em furto de R$ 6,00 em milho. O relator deste caso foi o Ministro Ricardo Lewandowski que tem entendimento mais restritivo quanto ao princípio que o Ministro Gilmar Mendes e mesmo assim votou pela concessão da ordem. As instâncias anteriores também tinham invocado a folha de antecedentes do acusado para afastar a bagatela.

Espero que, independentemente do resultado do Plenário, situações como as duas narradas acima não sejam completamente ignoradas, mantendo-se hígidas condenações completamente despidas de qualquer razoabilidade.

Como o tema é instigante e bastante recorrente em minha atuação como Defensor Público Federal, pretendo voltar a ele.

Brasília, 8 de junho de 2015

Gustavo de Almeida Ribeiro

Maus antecedentes e período depurador

Maus antecedentes e período depurador

Gustavo de Almeida Ribeiro

O Código Penal atual estabeleceu, na redação a ele dada pela Lei 7.209/1984, em seu artigo 64, inciso I, limitação temporal máxima para a consideração de crime anterior como capaz de gerar reincidência. Assim, passados mais de 5 (cinco) anos entre o cumprimento ou a extinção da pena e a infração posterior, o acusado não será considerado reincidente.

Entretanto, o mesmo texto legal foi omisso quanto aos maus antecedentes, não fixando prazo máximo para a consideração de condenação anterior.

Assim, parte predominante da jurisprudência brasileira entendia não haver qualquer limitação temporal para a invocação de condenações pretéritas como maus antecedentes.

A Defensoria Pública da União, inconformada com a posição prevalecente, e com base principalmente na vedação contida na Carta Constitucional de 1988, mais precisamente em seu artigo 5º, inciso XLVII, “b”, que estabelece que não haverá penas de caráter perpétuo, impetrou diversos habeas corpus perante o Supremo Tribunal Federal pugnando pela aplicação do mesmo período depurador estabelecido para a verificação de reincidência, ou seja, 5 (cinco) anos.

Inicialmente, os pedidos restaram indeferidos, vide, como exemplo, decisão proferida pela Colenda 1ª Turma, em julgamento ocorrido em 08/02/2011, no RHC 106814.

Mais recentemente, entretanto, o citado colegiado alterou seu entendimento para limitar a consideração de maus antecedentes em 5 (cinco) anos após o final da pena, nos termos da decisão prolatada no julgamento do HC 119200, ocorrido em 11/02/2014 e no RHC 118977, julgado em 18/03/2014.

Por sua vez, a Colenda 2ª Turma, em julgamento datado de 22/04/2014, do RHC 116070, afastou o limite temporal para a aplicação dos maus antecedentes, sob o fundamento de não ser ele aplicável como ocorre na reincidência.

Entretanto, o E. Ministro Celso de Mello, ao conceder monocraticamente, em decisão proferida em 25/02/2015, o HC 123189, versando sobre a temática em comento, invocou precedente relatado pelo Ministro Gilmar Mendes, julgado pela 2ª Turma, em que a ordem foi concedida. Trata-se do HC 110191, apreciado em 23/04/2013.

Foram pautados, em data recente, dois feitos por E. Ministros que compõem a 2ª Turma discutindo o mesmo assunto, são eles os Habeas Corpus 126315 e 125586. Em ambos, os Relatores votaram pela concessão da ordem, Ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli respectivamente, sendo os julgamentos interrompidos por pedidos de vista formulados pela Ministra Cármen Lúcia, Relatora, aliás, do RHC 116070, supracitado.

Certo é que o tema, ao que parece, considerando-se as posições até agora externadas em julgamentos recentes por Ministros que compõem as duas Turmas, de forma majoritária, consolida-se cada vez mais no sentido do que buscado pela Defensoria Pública, ou seja, de que deve haver prazo máximo para a consideração de fato anterior como antecedente negativo, nos termos do que ocorre com a reincidência, que, frise-se, é mais grave e ainda assim é limitada no tempo.

O entendimento defendido pela Instituição tem como supedâneo principal a vedação das penas de caráter perpétuo, vez que condenação anterior não pode ser utilizada indefinidamente para majorar outra sem qualquer limite. Aliás, a se entender pela consideração de condenação pretérita como maus antecedentes independentemente de lapso temporal, cria-se uma pena que ultrapassa até mesmo o prazo máximo prescricional previsto no Brasil de 20 (vinte) anos, lembrando-se ser a prescritibilidade regra em nosso ordenamento.

Por fim, vai ao encontro das seguidas manifestações da Defensoria Pública quanto ao tema o disposto no artigo 80 do Anteprojeto de Código Penal, entregue em junho de 2012 ao Presidente do Senado pela Comissão Especial de Juristas, presidida pelo Ministro Gilson Dipp, do STJ, que fixou prazo máximo de 5 (cinco) anos para a consideração de condenação anterior que não gere reincidência como maus antecedentes.

Adotada a redação sugerida pela Comissão, o problema estará sanado. Até lá, cumpre ao Poder Judiciário dar ao tema tratamento consentâneo com a proporcionalidade, a razoabilidade e a vedação das penas de caráter perpétuo.

Brasília, 22 de abril de 2015

Direito e assuntos diversos.