Uma rápida explicação
Gustavo de Almeida Ribeiro
É muito difícil discutir salário. Sempre. Por diversas razões. É mais complicado ainda quando ele, em valores absolutos, não é baixo para os padrões nacionais, apesar da defasagem crescente.
Ocorre que as carreiras assemelhadas andam juntas, pelo que as análises devem ultrapassar a frieza dos números.
Sou Defensor Público Federal há quase 15 anos. Confesso, para início de informação, que o salário da carreira quando ingressei na Instituição era bastante baixo. Passado algum tempo, ele foi igualado ao das carreiras da AGU, abaixo da Magistratura e do Ministério Público, mas digno.
Atualmente, desenha-se uma situação complicada em que a AGU vai obter ganhos, com a percepção de honorários, enquanto a Magistratura Federal e o MPU, ainda que não consigam novo aumento – além do obtido em 2014, que não nos abrangeu – já têm remuneração bem maior do que a Defensoria Pública da União.
Feita essa breve introdução, calha colocar algumas coisas em seu devido lugar para que as pessoas, ainda que discordem da insatisfação generalizada que tomou conta dos Defensores Públicos Federais, ao menos tenham noção da realidade.
Em primeiro lugar, importa dizer que os vencimentos de um Defensor Público Federal em início de carreira são, no máximo, a metade daqueles percebidos por um Juiz Federal ou Procurador da República também recém-ingressos. As vantagens existentes nestes cargos não se repetem na Defensoria, tais como férias de 60 dias ou o pagamento de substituições. Perdemos de longe também na comparação remuneratória com várias das Defensorias Estaduais.
Além disso, a DPU não conta, até hoje, com carreira de apoio, o que tem efeito duplo. Atrasa o trabalho, prejudicando enormemente o cidadão, pois o Defensor passa a ser responsável por toda a condução do gabinete, sendo ainda desgastante, não só pelo tempo dispendido, mas pelo cansaço que tarefas que poderiam ser resolvidas por outros geram. Como exemplo, informo que a única servidora que trabalha em meu gabinete, cedida de outro órgão, é formada em química, tendo natural dificuldade com questões simples ligadas ao Direito.
A remuneração do Defensor Federal, se comparada, por exemplo, à do Procurador da República, é bem inferior, gerando insatisfação e desânimo nos membros. Por isso, os valores não podem ser vistos isoladamente, devendo ser comparadas carreiras públicas com exigências de conhecimentos técnicos, dedicação e ingresso assemelhadas.
Cabe agora refutar outro argumento lamentável, para se dizer o mínimo. “Está insatisfeito, faça concurso para Juiz ou Procurador”. Tal questionamento é preconceituoso sob diversos enfoques: a) em termos de carreira pública, só o acusador e o julgador devem ser preparados?, b) a defesa daquele que pode escolher seu advogado e pagá-lo também pode ser qualificada, c) já para o cidadão carente que conta com a Defensoria Pública, qualquer coisa serve, seja porque muitos acabarão migrando para carreiras mais rentáveis, seja pelo desânimo normal que advém de um tratamento desigual. Embora discorde, até seria capaz de respeitar quem pensa assim, desde que tal manifestação fosse feita às claras, principalmente quando proveniente de políticos.
Também com relação àqueles que laboram na esfera privada, a explicação da situação dos Defensores não é fácil. Em primeiro lugar, lutamos contra a preconceituosa condição de “defensor de bandido”, enxergada por aqueles que se esquecem que todos têm direito à defesa, além de não militarmos apenas na matéria penal, longe disso. Em seguida, muitos querem julgar os salários apenas com base nos números absolutos, deixando de lado a comparação com as outras carreiras, o que se mostra inadequado, como já mencionado. Mais ainda, muitas pessoas, por desinformação, pensam que todas as carreiras percebem as mesmas vantagens, o que, como já indiquei acima, está muito longe de ser verdade.
Aqui, reitero: Defensor Público Federal recebe seu subsídio e nada mais. Não há adicionais, auxílios, férias extras, 14º salário. Nada disso. A carreira conta com pouquíssimos cargos em comissão, pelo que a maioria dos Defensores ganha o que está descrito na Lei, sem os famosos penduricalhos. Em tempo, concordo com essa situação. Defendo salários adequados, pagamento por substituições, e poucos cargos em comissão, como regra, para todas as carreiras.
A DPU vive diuturnamente a dificuldade de ser a responsável pela defesa dos mais fracos, do mais frágeis, quase sempre esquecidos pelos noticiários, pelos pensamentos dos políticos ou pela sociedade em geral.
O tratamento digno ao Defensor importa a este, claro, mas também a todos a quem ele representa, bem a como à sociedade, na medida em que promove a redução das desigualdades e a inclusão social.
O esforço, a dedicação e a vocação são fundamentais, mas precisam encontrar respeito por parte do empregador. As conquistas e os espaços são galgados aos poucos, mas a sensação de desprezo desanima qualquer guerreiro.
Em suma, a situação enfrentada pelos Defensores Federais deve ser olhada em conjunto, em cotejo com as demais carreiras, sendo feitas reflexões também no que representa a realidade que talvez se desenhe, não só para mim e meus colegas, mas para todos para quem atuamos. Havia mais a ser dito, mas por ora basta para uma compreensão da situação e da nossa insatisfação.
Brasília, 11 de julho de 2016