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A “federalização” da saúde

A “federalização” da saúde

Comentei mais cedo, em minha conta no twitter, que colocaria em meu blog petição elaborada pelo colega Antonio Ezequiel Barbosa sobre a chamada federalização da saúde, situação que em muito preocupa a Defensoria Pública.

Busca-se evitar um entendimento, ao ver da DPU, equivocado, de obrigar que todos os medicamentos não padronizados na lista RENAME do SUS sejam demandados em face da União, o que, dentre outras coisas, levaria todos os processos para a Justiça Federal.

É preciso destacar que o STJ tem posição consolidada contrária a essa federalização. Todavia, ela foi adotada recentemente pela 1ª Turma do STF.

A situação é preocupante, sendo, no entendimento da Defensoria, um alargamento indevido do quanto definido no tema 793 da repercussão geral pelo STF (fornecimento de medicamentos e solidariedade). A questão também não se confunde com o pedido de medicamentos não registrados na ANVISA. Para estes, a inclusão da União no polo passivo é obrigatória, conforme decidido pelo STF no RE 657718.

Caso prevaleça o entendimento de que os medicamentos não constantes da lista do SUS devem ser demandados em face da União, o acesso à Justiça por parte dos mais pobres e distantes dos grandes centros ficará ainda mais precário.

A leitura da peça abaixo dá boa noção da situação.

Gustavo de Almeida Ribeiro

Brasília, 10 de junho de 2022

Terra indígena e marco temporal

Terra indígena e marco temporal

 

A Defensoria Pública da União foi admitida como amicus curiae no RE 1017365, em trâmite no STF, com repercussão geral reconhecida, de relatoria do Ministro Edson Fachin.

O tema tratado no recurso é a discussão sobre o marco temporal na posse de terra indígenas. Transcrevo, abaixo, a ementa do acórdão que reconheceu a repercussão geral no recurso extraordinário:

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. POSSE INDÍGENA. TERRA OCUPADA TRADICIONALMENTE POR COMUNIDADE INDÍGENA. POSSIBILIDADES HERMENÊNTICAS DO ARTIGO 231 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. TUTELA CONSTITUCIONAL DO DIREITO FUNDAMENTAL INDÍGENA ÀS TERRAS DE OCUPAÇÃO TRADICIONAL. 1. É dotada de repercussão geral a questão constitucional referente à definição do estatuto jurídico-constitucional das relações de posse das áreas de tradicional ocupação indígena à luz das regras dispostas no artigo 231 do texto constitucional. 2. Repercussão geral da questão constitucional reconhecida.” (RE 1017365 RG, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, julgado em 21/02/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-075 DIVULG 10-04-2019 PUBLIC 11-04-2019 )

A DPU apresentou sua manifestação, através dos colegas Esdras Carvalho, da AASTF*, e Atanásio Lucero Júnior, Defensor Nacional de Direitos Humanos. Na petição, além do pedido de intervenção como amicus curiae, foi formulado, ainda, pleito de tutela de urgência.

Manifestação DPU RE 1017365

Gustavo de Almeida Ribeiro

Brasília, 21 de abril de 2020

*Assessoria de Atuação no STF

Recurso Extraordinário com repercussão geral e objetivação

Recurso Extraordinário com repercussão geral e objetivação

 

Seguem, abaixo, as razões recursais do agravo interno no RE 657718, extinto sem resolução de mérito pelo Relator, Ministro Marco Aurélio, pelo falecimento da autora.

A sistemática da repercussão geral faz com que a análise de um tema, além de ter efeitos ampliados, demore muito mais.

Isso precisa ser considerado pela Corte, tanto que não são raros os casos de perda de objeto durante o trâmite recursal.

O recomeço de um julgamento com a escolha de um novo paradigma a ninguém aproveita, gerando atraso considerável em feitos que, muitas vezes, aguardam solução por anos.

Vamos ver o que dirá o STF no caso em concreto.

Brasília, 2 de outubro de 2018

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

DAS RAZÕES RECURSAIS

 

A sistemática da repercussão geral promove a discussão, não só do caso em concreto, mas da tese, que servirá de paradigma a ser seguida pelos demais Tribunais pátrios.

Assim, o Supremo Tribunal Federal já entendeu que a perda parcial de objeto em recurso com a mencionada sistemática não significa seu prejuízo, conforme pode ser constatado da ementa abaixo transcrita, que decidiu questão de ordem em situação assemelhada:

“Ementa: Direito Eleitoral. Agravo em Recurso Extraordinário. Candidatura avulsa. Questão de ordem. Perda do objeto do caso concreto. Viabilidade da repercussão geral. 1. A discussão acerca da admissibilidade ou não de candidaturas avulsas em eleições majoritárias, por sua inequívoca relevância política, reveste-se de repercussão geral. Invocação plausível do Pacto de São José da Costa Rica e do padrão democrático predominante no mundo. 2. Eventual prejuízo parcial do caso concreto subjacente ao recurso extraordinário não é impeditivo do reconhecimento de repercussão geral. 3. Repercussão geral reconhecida. “ (ARE-QO 1054490, Relator(a):  Min. ROBERTO BARROSO, julgado em 05/10/2017, publicado em 09/03/2018, Tribunal Pleno) grifo nosso

Na mesma linha, a Suprema Corte já apreciou apelo extremo em matéria penal em que tinha sido extinta a punibilidade pela prescrição:

“Recurso extraordinário. Constitucional. Direito Penal. Contravenção penal. 2. Posse não justificada de instrumento de emprego usual na prática de furto (artigo 25 do Decreto-Lei n. 3.688/1941). Réu condenado em definitivo por diversos crimes de furto. Alegação de que o tipo não teria sido recepcionado pela Constituição Federal de 1988. Arguição de ofensa aos princípios da isonomia e da presunção de inocência. 3. Aplicação da sistemática da repercussão geral – tema 113, por maioria de votos em 24.10.2008, rel. Ministro Cezar Peluso. 4. Ocorrência da prescrição intercorrente da pretensão punitiva antes da redistribuição do processo a esta relatoria. Superação da prescrição para exame da recepção do tipo contravencional pela Constituição Federal antes do reconhecimento da extinção da punibilidade, por ser mais benéfico ao recorrente. 5. Possibilidade do exercício de fiscalização da constitucionalidade das leis em matéria penal. Infração penal de perigo abstrato à luz do princípio da proporcionalidade. 6. Reconhecimento de violação aos princípios da dignidade da pessoa humana e da isonomia, previstos nos artigos artigos 1º, inciso III; e 5º, caput e inciso I, da Constituição Federal. Não recepção do artigo 25 do Decreto-Lei 3.688/41 pela Constituição Federal de 1988. 7. Recurso extraordinário conhecido e provido para absolver o recorrente nos termos do artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal.” (RE 583523, Relator(a):  Min. GILMAR MENDES, julgado em 03/10/2013, publicado em 22/10/2014, Tribunal Pleno) grifo nosso

Mais recentemente, ao julgar o RE 601580, o STF voltou a decidir ser possível a apreciação da tese mesmo que o recurso esteja prejudicado, em se tratando de repercussão geral reconhecida. Cabe transcrever trecho do Informativo 916/STF, no que interessa ao presente caso (o acórdão ainda não foi publicado):

“(…)
Inicialmente, o Plenário, também por maioria, rejeitou questão de ordem suscitada pelo ministro Marco Aurélio no sentido de converter o julgamento em diligências para se verificar se o militar, do caso concreto, já teria concluído o curso, o que levaria ao prejuízo do recurso. O Tribunal considerou ser possível a apreciação da tese de repercussão geral em recurso extraordinário, ainda que o processo esteja prejudicado, em razão a objetivação dos recursos extraordinários, já reconhecida em decisões anteriores. Frisou a eficácia vinculante das teses firmadas em repercussão geral e o disposto nos artigos 998, parágrafo único (6), e 1.029, §3º (7), do CPC. Vencido o ministro Marco Aurélio que acolhia a questão de ordem, no sentido da necessidade da diligência, haja vista a impossibilidade do prosseguimento da análise da tese debatida no recurso extraordinário, se reconhecido o seu prejuízo, por se tratar de processo subjetivo.

(…)

 (6) CPC: “Art. 998. O recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos litisconsortes, desistir do recurso. Parágrafo único. A desistência do recurso não impede a análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida e daquele objeto de julgamento de recursos extraordinários ou especiais repetitivos.”
(7) CPC: “Art. 1.029. O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos previstos na Constituição Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em petições distintas que conterão: (…) § 3º O Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça poderá desconsiderar vício formal de recurso tempestivo ou determinar sua correção, desde que não o repute grave.”

RE 601580/RS, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 19.9.2018. (RE-601580)” grifo nosso

Ou seja, a importância do julgamento vai além do caso concreto subjacente, sendo relevante a fixação de tese geral.

São duas, portanto, as fortes razões que justificam o provimento do presente agravo, com o prosseguimento da análise do apelo excepcional. Em primeiro lugar, a relevância do tema em discussão, que não atingiria apenas a autora.

Aliás, o medicamento por ela postulado já se encontrava registrado na ANVISA pelo que o objeto da ação, quanto ao pleito autoral, já tinha se esgotado – situação há muito informada nos autos.

A matéria transcende o mero interesse das partes, sendo relevante sua análise. Aliás, saúde é um bem urgente, pelo que qualquer demora poderá causar o mesmo deslinde ocorrido neste caso.

Além disso, como demonstra o longo trâmite processual, o recomeço, com possíveis novas sustentações orais, novos votos, caso seja escolhido novo processo, significará demora ainda maior na apreciação do tema.

Assim, como para a fixação da tese a ser aplicada em casos semelhantes, o processo em análise continua perfeitamente adequado, tal como ocorreu nos precedentes acima colacionados ele deve ser preservado em homenagem à celeridade. Interessa a todos os que necessitam de medicamentos a rápida solução do feito para que possam, em havendo resultado favorável, no que acredita a Defensoria Pública, buscar seus fármacos de forma mais breve possível.

Portanto, deve ser provido o presente agravo, dando-se continuidade à apreciação do recurso extraordinário.

 

Cálculos nos Juizados Especiais – RE 729884/STF

Cálculos nos Juizados Especiais – RE 729884/STF

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Foi julgado pelo Plenário do STF, na sessão de 23 de junho de 2016, o RE 729884, com repercussão geral reconhecida, em que se discutia a quem compete realizar os cálculos nas condenações impostas pelo Juizado Especial ao INSS.

Transcrevo abaixo a tese discutida:

“EXECUÇÃO DE SENTENÇA. IMPOSIÇÃO AO INSS, NOS PROCESSOS EM QUE FIGURE COMO PARTE RÉ, DO DEVER DE ELABORAR OS CÁLCULOS DO VALOR DA CONDENAÇÃO. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DA ISONOMIA, DA LEGALIDADE E DA SEPARAÇÃO DE PODERES. LEI Nº 9.099/95, ARTIGO 52, INCISOS I E II. CF/88, ARTS. 2º; 5º, CAPUT E INCISOS II, LIV E LV; 22, I; E 37, CAPUT.
Saber se o acórdão recorrido ofende os princípios do devido processo legal, da isonomia, da legalidade e da separação de poderes.” (fonte: site do STF)

A participação da DPU no caso como amicus curiae teve dois objetivos principais: o primeiro, açular o julgamento célere da causa, encerrando o sobrestamento de milhares de feitos sobre o tema. O segundo, defender a realização dos cálculos pela autarquia, que dispõe dos dados do segurado e, assim, pode confeccioná-los mais rapidamente. Além disso, quando a Justiça elabora os cálculos, ela tem que submetê-los às partes, o que gera ainda mais atraso no recebimento dos valores devidos aos segurados.

Após os processos terem ficado tempos parados, o STF entendeu que o tema não tem natureza constitucional, pelo que não conheceu do recurso:

“Decisão: O Tribunal, por maioria, não conheceu do recurso extraordinário, ao entendimento de que a pretensão deduzida repousa apenas na esfera da legalidade, concluindo pela inexistência de questão constitucional e, por conseguinte, de repercussão geral. Tudo nos termos do voto do Relator. Vencido o Ministro Edson Fachin, que conhecia do recurso extraordinário e negava-lhe provimento. Ausente, neste julgamento, o Ministro Gilmar Mendes. Falaram, pelo requerente, Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, o Dr. Dalton Santos Morais, Procurador Federal da Procuradoria-Geral Federal, e, pelo amicus curiae Defensoria Pública da União, o Dr. Gustavo Zortéa da Silva, Defensor Público Federal. Presidiu o julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski. Plenário, 23.06.2016.” (fonte: site do STF)

Na mesma sessão, foi iniciado o julgamento da ADPF 219, cuja tese transcrevo abaixo (dessa não participamos, a ADPF não gerou sobrestamento dos feitos e o tema de fundo era muito próximo):

“ADPF. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. LIQUIDAÇÃO. DECISÕES JUDICIAIS QUE DETERMINAM COMPETIR À UNIÃO O DEVER DE APURAR OU INDICAR, NOS PROCESSOS EM QUE FIGURE COMO RÉ/EXECUTADA, O VALOR DEVIDO À PARTE AUTORA/EXEQUENTE. LEI Nº 9.099/95, ARTIGO 52, INCISOS I E II. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTS. 2º, 5º, CAPUT, E INCISOS II, LIV E LV; 22, I; E 37, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
Saber se as decisões impugnadas ofendem preceito fundamental da Constituição.”

O julgamento da ADPF em questão foi interrompido por pedido de vista do Min. Luiz Fux.

Se um feito não tem questão constitucional, o outro teria?

O que importa é que a DPU lutou pela celeridade na apreciação do RE 729884 em favor dos assistidos e dos segurados em geral do país.

Nossa intervenção foi postulada em peça elaborada pelo Defensor Antonio Ezequiel I. Barbosa, cuja leitura recomendo (os autos eletrônicos do RE são acessíveis independentemente de assinatura eletrônica).

 

Brasília, 26 de junho de 2016

Haja instabilidade

Haja instabilidade

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Fui intimado dias atrás do acórdão prolatado no HC 94620, julgado pelo Plenário do STF, sob a relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski.

O citado writ discutia, em suma, questões atinentes à dosimetria penal, entre elas a consideração de feitos em andamento como maus antecedentes.

O início do julgamento deu-se em 12 de março de 2009, oportunidade em que fiz minha primeira sustentação oral no Plenário da Suprema Corte. Após o voto do Ministro Ricardo Lewandowski denegando a ordem, o Ministro Cezar Peluso pediu vista.

O habeas corpus em questão voltou à mesa após a apreciação do RE 591054, com repercussão geral reconhecida, em que se discutia justamente a consideração ou não dos processos penais em andamento como maus antecedentes. O mencionado recurso teve seu julgamento iniciado em 5 de junho de 2014, sendo concluído em 17 de dezembro de 2014. Por maioria de 6 votos a 4, decidiu-se que feitos em andamento não configuram maus antecedentes. Compuseram a corrente vencedora os Ministros Marco Aurélio (relator), Roberto Barroso, Teori Zavascki, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Celso de Mello. Votaram vencidos os Ministros Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Luiz Fux e Cármen Lúcia. Como pode se observar, todos os Ministros que votaram no citado recurso ainda integram o STF na data atual. Posteriormente, foi nomeado o Ministro Edson Fachin que, de qualquer modo, não seria capaz de mudar a maioria formada.

Por isso, quando o Ministro Teori Zavascki, sucessor do Ministro Cesar Peluso, levou o HC 94620 para continuidade de julgamento, pensei que a questão dos maus antecedentes seria decidida sem maiores debates.

Entretanto, para minha surpresa, mesmo a retomada da apreciação do HC tendo ocorrido 6 meses após o final do julgamento do Recurso Extraordinário com repercussão geral, a Corte sinalizou revisão de seu entendimento. Reitero: não houve mudança na composição do Tribunal que justificasse tal alteração. Ao final, ordem foi concedida em parte, adiando-se a revisita ao tema. Todavia, chamaram a atenção as discussões ocorridas na sessão do Pleno do STF de 24 de junho de 2015, oportunidade em que se concluiu o julgamento.

O Ministro Ricardo Lewandowski, atual presidente, chegou a declarar durante os debates no HC 94620:

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI (PRESIDENTE E RELATOR) – Bom, o julgamento não terminou ainda, enquanto não for proclamado o resultado, todos nós podemos mudar o nosso voto. Na verdade, eu sinto um certo desconforto em proclamar um resultado que não reflete o sentimento do Plenário atualmente. Essa é que é a verdade.

Eu até, como antecipei o meu voto, porque entendi que o Ministro Teori também estava se curvando ao princípio da colegialidade, e eu também respeito muito esse princípio, no fundo, acabei levando o eminente Ministro Fachin a também concluir nesse sentido. Mas essa não é a vontade presente do Plenário, eu acho que nós poderíamos retomar, vamos fazer uma nova votação. ”

Ao que parece, novo processo será escolhido para a rediscussão da matéria.

Feitas as colocações acima, algumas perguntas se impõem:

  1. Qual o sentido do instituto da repercussão geral, para se mudar a decisão meses depois, estando o STF com a mesma composição? Os processos apreciados pelo Tribunal sob essa sistemática passam por extenso e demorado debate, com a participação de terceiros, sustentações, memoriais. Não são decisões tomadas subitamente em ações que jorram em abundância diariamente.
  2. Como pode a Corte reclamar do excesso de feitos se ela mesma estimula o desrespeito a seus julgados ao mudar de posição inopinadamente?
  3. Por fim, como se atribuir, em matéria penal, a possibilidade de o Ministério Público, titular da ação penal pública, escolher outro feito para servir de paradigma? Transcrevo o andamento extraído do sítio eletrônico do STF, constante, aliás, do extrato de ata:

“Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto ora reajustado do Relator, Ministro Ricardo Lewandowski (Presidente), concedeu, em parte, a ordem de habeas corpus para determinar ao Juízo da Vara de Execuções Penais que proceda ao novo cálculo da pena dos pacientes, devendo considerar como circunstâncias negativas, na primeira fase da dosimetria, tão somente a culpabilidade e as conseqüências do crime, vencidos os Ministros Luiz Fux e Cármen Lúcia, que denegavam a ordem. O Tribunal se pronunciou no sentido da possibilidade de rever a tese firmada no RE 591.054, e, nesse sentido, o Ministério Público Federal envidará esforços para identificar um caso para submeter ao Plenário oportunamente. Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello. Plenário, 24.06.2015.”

A Defensoria Pública também será chamada a escolher processos paradigmas ou essa possibilidade somente será concedida ao MP? Também somos carreira de Estado, também patrocinamos incontáveis feitos em matérias que nos são atinentes.

Qual será o critério da escolha feita pela parte? Um caso concreto que demonstre bem o acerto de sua posição? Quanto ao tema específico, o parecer da Procuradoria Geral da República foi no sentido da consideração de processos em andamento como maus antecedentes, posição coincidente, aliás, com a do Presidente do STF. Embora os recursos sob a sistemática da repercussão geral tenham como objetivo a fixação de uma tese, ao contrário das ações de controle concentrado, veiculam caso concreto que pode, sim, influenciar no ânimo do Julgador. Assim, a invocação de um processo em andamento pelo crime de furto simples para a configuração da circunstância judicial maus antecedentes tem peso distinto da invocação de um homicídio qualificado. A escolha será dada ao titular da ação penal, que inclusive já se posicionou quanto ao assunto?

Nem sempre os feitos indicados são os melhores para se debater um tema, mas presume-se que o Juiz que o escolheu é imparcial. Em matéria penal o Ministério Público é parte, é o autor das ações penais públicas, mesmo que possa também exercer a função de custos legis.

Por enquanto não tive notícias da indicação de outro processo. Espero permaneça assim, por todas as razões acima indicadas e também porque, convenhamos, se a reincidência que invoca decisões transitadas em julgado para majorar a pena já é de duvidosa constitucionalidade, o que se dizer de um mero processo ainda em trâmite? Processos que podem resultar em absolvição serão usados para majorar a pena em outras acusações, um absurdo facilmente compreensível e plausível. A pessoa deve pagar pelo que fez, correspondendo a cada ato uma resposta adequada e proporcional do Estado-Juiz. O que sobejar deve ser rechaçado, em respeito aos princípios do juiz natural, do estado de inocência e da vedação do bis in idem. Pensavam que essa página já tinha sido virada. Ledo engano.

Brasília, 8 de dezembro de 2015