Breve comentário sobre o julgamento da ADI 5874 (indulto) até aqui
Gustavo de Almeida Ribeiro
Os debates ocorridos no julgamento da ADI 5874, em que se discute a constitucionalidade do Decreto de Indulto 9246/17 poderiam ser resumidos, de forma extremamente simplista, em:
a – cabe ao STF apenas verificar se o decreto ofendeu o disposto no artigo 5º, XLIII, da CF, que estabelece as restrições para a concessão de indulto, e, ainda, se houve desvio de finalidade por parte do Presidente da República;
ou
b – pode o STF verificar outros aspectos, avaliando percentuais de cumprimento de pena para a concessão do indulto, crimes abrangidos, entre outros.
Como se sabe, até agora, 8 Ministros votaram, 6 deles entendendo que não cabe ao STF se imiscuir no decreto de indulto, ressalvados os limites impostos pela CF/88, enquanto 2 decotavam dispositivos do texto presidencial.
Em seguida, a sessão foi interrompida por pedido de vista do Ministro Luiz Fux.
Sobreveio então outra discussão: se seria mantida a liminar concedida, por decisão monocrática, pelo Ministro Roberto Barroso, relator.
Ela então foi mantida por 5 a 4, com pedido de vista do Ministro Dias Toffoli quanto à questão de ordem.
Narrado, brevemente, o que aconteceu, nas sessões de 28 e 29 de novembro do Plenário do STF, farei algumas considerações.
A questão sobre os limites do poder de indultar, se contidos apenas no mencionado inciso XLIII, do artigo 5º, da CF/88, ou se também passíveis de extração de outros dispositivos da própria Constituição Federal, é bastante interessante e mereceria reflexão e análise mais elaboradas do que as que pretendo tecer.
Todavia, ainda que se chegue à conclusão de que existem outros limites, cabe avaliar se no caso em tela ocorreu essa extrapolação, se estão presentes esses excessos visíveis e ostensivos, ou se, ao contrário, houve invasão, por parte de quem concedeu e manteve a liminar, da prerrogativa presidencial.
Em meu sentir, penso que os inúmeros votos que entenderam pela constitucionalidade do Decreto de Indulto de 2017 mostraram de forma clara que ele não desbordou, de forma excessiva, daqueles editados em anos anteriores.
Mais ainda, penso que as decisões cautelares da Ministra Presidente e do Relator entenderam excessivos dispositivos que vinham sendo repetidos em sucessivos indultos natalinos. O melhor exemplo disso diz respeito às penas restritivas de direito.
Há anos esse tipo de reprimenda, destinada a crimes sem violência ou grave ameaça, com penas não superiores a 4 anos em crimes dolosos, vem sendo objeto de indulto.
Se o indulto para penas restritivas de direito fosse mesmo inconstitucional, por que não foi atacado ano após ano? E, não sendo flagrantemente inconstitucional, por que o deferimento e a manutenção da liminar suspensiva por quase 1 ano? Aliás, existem várias decisões do STF reconhecendo ser possível o indulto de penas restritivas de direito, uma delas proferida pelo Ministro Relator da ADI 5874.
Penso que sob o fundamento de se questionar a concessão de indulto aos chamados criminosos de colarinho branco, a inicial da ADI e as decisões monocráticas prolatadas se excederam, com o devido respeito.
Assim, ainda que esteja disposto a refletir se medidas presidenciais excessivamente generosas poderiam ser sindicadas pelo STF, além das vedações constitucionais expressas, penso que não foi esse o caso do Decreto de Indulto de 2017, notadamente em relação a certos aspectos impugnados. Repito, houve farta comparação do texto de 2017 com edições anteriores, sem que fosse indicada grande inovação.
Todavia, o mais curioso, em minha opinião, foi a manutenção da liminar quando declarada, pela maioria da Corte, a constitucionalidade do Decreto. O STF, até o presente momento, entendeu ser constitucional o indulto, por maioria, todavia, o entendimento de apenas um Ministro impede sua aplicação? Sim, o julgamento não acabou e a linha atual pode ser modificada, é fato. Mas uma cautelar monocrática, em sede de controle concentrado, é ainda mais precária e nunca deveria prevalecer diante de divergência formada do colegiado, principalmente se considerado o disposto no artigo 10 da Lei 9868/99[1]. O que ocorreu foi a submissão da maioria a um único Ministro. Pior ainda, a constitucionalidade do texto normativo se presume. Cautelares são dadas em sede concentrada para se afastar tal presunção. No caso, além da presunção, já há manifestação majoritária pela constitucionalidade. Há fumaça do bom direito quando a maioria já negou o direito?
Certo é que ficou tudo muito estranho em termos jurídicos.
Espero que esse julgamento se encerre logo. A mencionada liminar já perdura há quase um ano, não havendo mais qualquer motivo para sua prorrogação.
Como comentei em meu twitter, independentemente do resultado, essas questões relevantes, que interessam a milhares de pessoas, precisam ser logo apreciadas. A segurança jurídica agradece.
Brasília, 1º de dezembro de 2018
[1] Art. 10. Salvo no período de recesso, a medida cautelar na ação direta será concedida por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal, observado o disposto no art. 22, após a audiência dos órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado, que deverão pronunciar-se no prazo de cinco dias.