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Tráfico de drogas e prisão preventiva – 3,96g de cocaína

Tráfico de drogas e prisão preventiva – 3,96g de cocaína

 

Como o caso divulgado em meu twitter gerou repercussão, vou colocar abaixo a íntegra da decisão proferida pelo Ministro Gilmar Mendes no RHC 188194/STF, que manteve a prisão preventiva de pessoa acusada do tráfico de 3,96g de cocaína.

Brasília, 27 de agosto de 2020

Gustavo de Almeida Ribeiro

Decisão RHC 188194 STF

Excesso de Prazo – HC 145359/STF

Excesso de Prazo – HC 145359/STF

 

Colocarei abaixo link para a leitura do acórdão do HC 145359, julgado e concedido pela 1ª Turma do STF, após longo debate.

Discute-se muito a questão da prisão em segundo grau, a prisão em primeiro grau em caso de tribunal do júri, a necessidade de prisão em crimes de menor gravidade; todavia, penso que há um aspecto muito vivenciado pelos Defensores Públicos que precisa ser enfrentado, independentemente da gravidade do crime: a duração das prisões cautelares.

São vários os casos de pessoas presas há anos sem serem julgadas sequer em primeiro grau, devendo ser alterada tal situação.

Leiam os debates e as datas neles apontadas. Vale a pena.

Por fim, destaco o trabalho realizado na tribuna pela colega Tatiana Bianchini.

Gustavo de Almeida Ribeiro

Brasília, 14 de março de 2019

Acórdão HC 145359

Prisão cautelar e celeridade processual 

Prisão cautelar e celeridade processual 

 

O texto abaixo foi redigido pela minha colega, Dra. Tatiana Melo Aragão Bianchini, que proferiu sustentação oral no HC 145359, perante a 1ª Turma do STF.

A modéstia dela impediu que ela colocasse seu nome como responsável pela sustentação, essencial para a concessão da ordem por empate na votação.

A discussão veiculada no habeas corpus em questão era de excesso de prazo em prisão cautelar, tendo sido deferida liminar pelo Ministro Marco Aurélio, relator.

Na sessão de julgamento, ouvida a Defensoria Pública da União, na pessoa da colega, o Ministro Marco Aurélio confirmou a liminar e concedeu a ordem.

Os Ministros Rosa Weber e Roberto Barroso votaram por sua denegação. O Ministro Luiz Fux estava ausente.

O Ministro Alexandre de Moraes cogitou em denegar e determinar o julgamento célere. Ao ouvir isso, a Dra. Tatiana Bianchini fez essencial intervenção para apontar a fase atual do processo e a data da próxima audiência. Vejam abaixo.

Gustavo de Almeida Ribeiro

Brasília, 7 de janeiro de 2019

 

 

“Trata-se de habeas corpus no qual é pleiteada a liberdade provisória do paciente, preso preventivamente por garantia da ordem pública em 29/05/2015, acusado da prática do delito de homicídio qualificado (art. 121, §2º, I, III e IV, do CP) e também do crime previsto no art. 14 da Lei nº 10.826/2003. A custódia cautelar foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Piauí e pelo Superior Tribunal de Justiça.

Em que pese ter permanecido preso à disposição do juízo por longo período, o feito não chegou a seu termo, tendo o Ministro Marco Aurélio, em 26/06/2017, deferido liminar – que estendeu também ao corréu, na qual destacou que “O paciente está preso, sem culpa formada, há 2 anos e 27 dias. Nada justifica tal fato. Surge o excesso de prazo. Privar da liberdade, por tempo desproporcional, pessoa cuja responsabilidade penal não veio a ser declarada em definitivo viola o princípio da não culpabilidade. Concluir pela manutenção da medida é autorizar a transmutação do pronunciamento mediante o qual implementada, em execução antecipada de sanção, ignorando-se garantia constitucional”.

No último dia 27/11/2018 o caso foi levado à apreciação da Primeira Turma, que após sustentação oral da Defensoria Pública da União, por empate na votação, concedeu a ordem nos termos do voto do Relator, o Ministro Marco Aurélio, sendo de se destacar que a movimentação processual da ação penal, disponível no Sistema Themis Web – Consulta Pública, do TJPI na internet, demonstrou que a instrução ainda não havia sido encerrada, constando de referida movimentação que em outubro/2017 a audiência de instrução e julgamento foi redesignada para o dia 09/09/2020.

Em que pese a gravidade dos fatos imputados ao paciente, a situação posta, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas (CF, art. 5º, LXXVIII). Ademais, diverge frontalmente do quanto declarado na Convenção Americana sobre Diretos Humanos, adotada no Brasil através do Decreto n. 678/92, a qual consigna a ideia de que toda pessoa detida ou retida tem o direito de ser julgada dentro de um prazo razoável ou ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo.​”

Para quem quiser conferir, segue trecho do andamento extraído do sítio eletrônico do TJPI ( Comarca de Teresina, processo 0020092-04.2014.8.18.0140)

Andamento processual na origem. Comarca de Teresina/PI. A data na coluna da esquerda indica o dia em que lançada a movimentação.

Breve comentário sobre o julgamento da ADI 5874 (indulto) até aqui

Breve comentário sobre o julgamento da ADI 5874 (indulto) até aqui

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Os debates ocorridos no julgamento da ADI 5874, em que se discute a constitucionalidade do Decreto de Indulto 9246/17 poderiam ser resumidos, de forma extremamente simplista, em:

a – cabe ao STF apenas verificar se o decreto ofendeu o disposto no artigo 5º, XLIII, da CF, que estabelece as restrições para a concessão de indulto, e, ainda, se houve desvio de finalidade por parte do Presidente da República;

ou

b – pode o STF verificar outros aspectos, avaliando percentuais de cumprimento de pena para a concessão do indulto, crimes abrangidos, entre outros.

Como se sabe, até agora, 8 Ministros votaram, 6 deles entendendo que não cabe ao STF se imiscuir no decreto de indulto, ressalvados os limites impostos pela CF/88, enquanto 2 decotavam dispositivos do texto presidencial.

Em seguida, a sessão foi interrompida por pedido de vista do Ministro Luiz Fux.

Sobreveio então outra discussão: se seria mantida a liminar concedida, por decisão monocrática, pelo Ministro Roberto Barroso, relator.

Ela então foi mantida por 5 a 4, com pedido de vista do Ministro Dias Toffoli quanto à questão de ordem.

Narrado, brevemente, o que aconteceu, nas sessões de 28 e 29 de novembro do Plenário do STF, farei algumas considerações.

 

A questão sobre os limites do poder de indultar, se contidos apenas no mencionado inciso XLIII, do artigo 5º, da CF/88, ou se também passíveis de extração de outros dispositivos da própria Constituição Federal, é bastante interessante e mereceria reflexão e análise mais elaboradas do que as que pretendo tecer.

Todavia, ainda que se chegue à conclusão de que existem outros limites, cabe avaliar se no caso em tela ocorreu essa extrapolação, se estão presentes esses excessos visíveis e ostensivos, ou se, ao contrário, houve invasão, por parte de quem concedeu e manteve a liminar, da prerrogativa presidencial.

Em meu sentir, penso que os inúmeros votos que entenderam pela constitucionalidade do Decreto de Indulto de 2017 mostraram de forma clara que ele não desbordou, de forma excessiva, daqueles editados em anos anteriores.

Mais ainda, penso que as decisões cautelares da Ministra Presidente e do Relator entenderam excessivos dispositivos que vinham sendo repetidos em sucessivos indultos natalinos. O melhor exemplo disso diz respeito às penas restritivas de direito.

Há anos esse tipo de reprimenda, destinada a crimes sem violência ou grave ameaça, com penas não superiores a 4 anos em crimes dolosos, vem sendo objeto de indulto.

Se o indulto para penas restritivas de direito fosse mesmo inconstitucional, por que não foi atacado ano após ano? E, não sendo flagrantemente inconstitucional, por que o deferimento e a manutenção da liminar suspensiva por quase 1 ano? Aliás, existem várias decisões do STF reconhecendo ser possível o indulto de penas restritivas de direito, uma delas proferida pelo Ministro Relator da ADI 5874.

Penso que sob o fundamento de se questionar a concessão de indulto aos chamados criminosos de colarinho branco, a inicial da ADI e as decisões monocráticas prolatadas se excederam, com o devido respeito.

Assim, ainda que esteja disposto a refletir se medidas presidenciais excessivamente generosas poderiam ser sindicadas pelo STF, além das vedações constitucionais expressas, penso que não foi esse o caso do Decreto de Indulto de 2017, notadamente em relação a certos aspectos impugnados. Repito, houve farta comparação do texto de 2017 com edições anteriores, sem que fosse indicada grande inovação.

Todavia, o mais curioso, em minha opinião, foi a manutenção da liminar quando declarada, pela maioria da Corte, a constitucionalidade do Decreto. O STF, até o presente momento, entendeu ser constitucional o indulto, por maioria, todavia, o entendimento de apenas um Ministro impede sua aplicação? Sim, o julgamento não acabou e a linha atual pode ser modificada, é fato. Mas uma cautelar monocrática, em sede de controle concentrado, é ainda mais precária e nunca deveria prevalecer diante de divergência formada do colegiado, principalmente se considerado o disposto no artigo 10 da Lei 9868/99[1]. O que ocorreu foi a submissão da maioria a um único Ministro. Pior ainda, a constitucionalidade do texto normativo se presume. Cautelares são dadas em sede concentrada para se afastar tal presunção. No caso, além da presunção, já há manifestação majoritária pela constitucionalidade. Há fumaça do bom direito quando a maioria já negou o direito?

Certo é que ficou tudo muito estranho em termos jurídicos.

Espero que esse julgamento se encerre logo. A mencionada liminar já perdura há quase um ano, não havendo mais qualquer motivo para sua prorrogação.

Como comentei em meu twitter, independentemente do resultado, essas questões relevantes, que interessam a milhares de pessoas, precisam ser logo apreciadas. A segurança jurídica agradece.

Brasília, 1º de dezembro de 2018

 

 

 

 

[1] Art. 10. Salvo no período de recesso, a medida cautelar na ação direta será concedida por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal, observado o disposto no art. 22, após a audiência dos órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado, que deverão pronunciar-se no prazo de cinco dias.

Todos iguais

Todos iguais

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Em um dia como hoje, é bom mostrar como as coisas funcionam para um assistido da Defensoria.

Vou narrar a longa jornada de um processo de um réu atendido pela Defensoria.

Sim, o crime do qual é acusado o assistido da DPU é grave, mas meu objetivo é mostrar como a prisão cautelar indefinida nem sempre incomoda o STF.

O que vou contar abaixo pode ser verificado nos autos eletrônicos do HC 149766, impetrado junto ao STF, em que se busca a liberdade do paciente (foi um trabalho conjunto da DPU e da DPE/AL do primeiro grau até a Suprema Corte):

Em 22/05/2015, o paciente teria cometido homicídio.

Dias após os fatos, apresentou-se à autoridade policial, sendo liberando em seguida,

Em 26/08/2015, foi pedida sua prisão, sem grande fundamentação que justificasse a imposição de preventiva a partir dali. Transcrevo trecho:

“In casu, não obstante o privilegio da atual previsão legal para a aplicação preferencial de outras medidas cautelares que não a prisão preventiva, vislumbramos a presença do requisito para a sua decretação, qual seja a garantia da ordem pública, que se mostra ameaçada diante da pratica delitiva que traz em si grande lesividade aos bens jurídicos tutelados pelo direito penal, não sendo o caso de aplicação de outra medida cautelar prevista no artigo 319 do Código Processual Penal. ”

Foi preso em 10/09/2015.

Assim se encontra até a presente data.

Já teve audiências remarcadas 3 vezes.

O habeas corpus impetrado pela DPU, em 30/10/2017, perante o STF, teve seu seguimento negado, em 31/10/2017, pelo Ministro Dias Toffoli, relator.

Interpus agravo interno em 06/12/2017.

Enquanto isso, no primeiro grau, dia 12/12/2017, deveria ser ouvida uma testemunha e, ainda, interrogado o acusado.

Todavia, os agentes penitenciários do Estado de Alagoas estavam em greve, pelo que o réu, preso, não foi conduzido a audiência, sendo seu interrogatório remarcado para 19/04/2018.

Em suma, o interrogatório da fase inicial do Júri (judicium accusationis) foi atrasado em mais de 4 meses, por culpa EXCLUSIVA DO ESTADO, em se tratando de acusado preso há mais de 2 anos e 3 meses, quando do adiamento.

No dia 18/12/2017, o agravo regimental que interpus foi a julgamento. Assomei à tribuna para falar do último andamento na origem, ou seja, o adiamento do interrogatório, ocorrido após a interposição do recurso.

Não poderia sustentar, por não haver essa possibilidade em agravo interno.

Após ser advertido insistentemente pelo Ministro Edson Fachin, que preside a 2ª Turma, de que só poderia trazer questão de fato, esclareci o que tinha ocorrido na primeira instância.

O agravo foi negado.

Publicado o acórdão do agravo interno, foi expedido ofício à origem para que fosse dada celeridade à oitiva do paciente.

Opus embargos de declaração, dizendo que, até aquela data, não tinha havido qualquer antecipação do interrogatório.

Hoje é 23/03/2018, o assistido sequer foi pronunciado, estando preso há mais de 2 anos e 6 meses.

Aqui não há discussão de cumprimento de pena após o 1º, o 2º ou outro grau. O acusado não foi condenado.

Depois tenho que passar a tarde inteira ouvindo que todos são iguais, ou, ainda, que alguns conseguem as coisas por terem advogados contratados a peso de ouro.

Francamente.

Brasília, 23 de março de 2018

 

Óbvio, porém necessário

Óbvio, porém necessário

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Vez por outra questiono benefícios dados pela Justiça Brasileira a pessoas abastadas, poderosas ou famosas, valendo-me, para tanto, de minha conta no Twitter.

A linguagem telegráfica da mencionada rede social impede maiores esclarecimentos, que serão feitos aqui.

Penso que quem tem direito a um benefício na seara penal, incluídos aí o processo e a execução penal, deve recebê-lo de maneira célere, pouco importando sua condição econômica ou posição de destaque.

Por isso, não me irrito quando uma pessoa rica (ou acusada por crimes famosos), obtém, desde que merecedora, por exemplo, o direito de ficar em prisão domiciliar.

Minha chateação advém da sensação de que, muitas vezes, a celeridade, bem como o entendimento são distintos quando o acusado é um cidadão pobre, atendido pela Defensoria Pública.

Fico ainda mais irritado quando ouço a pré-histórica desculpa de que ricos têm bons advogados, não por ser mentira ou por desconhecer que, infelizmente, a Defensoria Pública não está em todos os lugares em que gostaríamos, mas por muitas vezes lutar fervorosamente pelos meus assistidos e obter resposta judicial negativa em situações que considero menos graves ou iguais a outras que tiveram desfecho distinto.

A concessão de prisão domiciliar e a indignação com a duração das prisões preventivas são dois dos casos em que mais noto a distinção no tratamento entre pobres e ricos.

O HC 145179, em trâmite no Supremo Tribunal Federal, traz um pouco dos dois: preventiva de quase dois anos de duração, sem julgamento em primeiro grau e assistida da Defensoria Pública mãe de duas crianças. A domiciliar foi indeferida, em sede liminar.

Duas observações sobre o writ em questão:

1 – Trata-se de feito complexo na origem? E os processos envolvendo os acusados na Lava-jato não o são? No entanto, tenho ouvido de alguns Ministros indignação com a demora nas prisões cautelares no chamado “petrolão”.

2 – A paciente do mencionado HC integraria grupo criminoso, tendo praticado conduta grave, o que poderia inviabilizar a concessão da prisão domiciliar. E o que se dizer de quem é acusado de saquear os cofres públicos de um Estado, deixando a população à míngua, como se vê todos os dias na grande imprensa?

Todavia, devo ser justo. Até que a Segunda Turma do STF várias vezes é bem rápida na apreciação dos pedidos da Defensoria Pública da União, mantendo visão mais libertária. Lamentavelmente, porém, multiplicam-se as situações em que as decisões monocráticas em profusão prejudicam o exercício da ampla defesa, ao vedarem a sustentação oral e colocarem os processos em julgamento virtual, mas isso é tema para outro texto.

Por outro lado, Primeira Turma é bastante rigorosa, inclusive no que concerne ao cabimento do habeas corpus, pelo que fiquei surpreso com a soltura da irmã do Senador Aécio Neves. Calha transcrever trecho de notícia divulgada no sítio eletrônico da Corte[1]:

“A prisão domiciliar foi implementada por sugestão do ministro Luiz Fux, que observou a existência de um paradoxo no caso, pois enquanto o senador Aécio Neves, apontado pelo MPF como autor principal do suposto delito, está solto, os partícipes que, embora tivessem domínio funcional de alguns fatos e executassem tarefas sem as quais a conduta criminosa não se concretizaria, estão presos. O ministro observou que, na fundamentação do decreto de prisão, o ministro Edson Fachin, relator original do processo, entendeu que, em razão da complexidade dos fatos, seria possível uma ingerência dos acusados na produção de provas. Em seu entendimento, essa situação já não existe, pois o MPF encontrou prova plena do delito de corrução para embasar a denúncia e afirma nos autos já ter elementos para o processamento de ação penal.”

Repiso: não se trata de defender prisão de ninguém, mas de se questionar aspecto curioso da decisão. Se existe motivo para a preventiva, mas o corréu tem foro por prerrogativa, ela se converte em domiciliar? (Cabe lembrar que a prisão da irmã do Senador tinha sido mantida uma semana antes da concessão da domiciliar, ou seja, a Turma considerou presentes os requisitos da preventiva.)

São essas as contradições que procuro destacar em meus tuítes. Seja com postura mais rigorosa ou garantista, o que espero é equilíbrio e coerência.

Brasília, 22 de julho de 2017

 

 

 

[1] http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=347163&caixaBusca=N