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Idosa doente e prisão domiciliar

Idosa doente e prisão domiciliar

 

Apresento, abaixo, o agravo que interpus no RHC 162575, em trâmite no STF, em face de decisão monocrática que manteve pessoa maior de 70 anos, doente, recolhida à prisão.

O julgado invocado como precedente, no que concerne ao pedido de prisão domiciliar, é de um famoso político.

Aproveitei a gravidade do caso para pedir para fazer sustentação oral no julgamento do agravo regimental.

Aguardemos.

Gustavo de Almeida Ribeiro

Brasília, 28 de junho de 2019

 

BREVE NARRAÇÃO DOS FATOS

A agravante foi condenada como incursa no artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006, à pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime inicial fechado, bem como ao pagamento de 600 (seiscentos) dias-multa.

Durante a tramitação processual, a agravante, idosa, vinha cumprindo pena no Presídio Regional de Criciúma. Após recomendação do médico, a apenada teve sua prisão preventiva substituída por prisão domiciliar, em decorrência das graves enfermidades das quais é portadora: hipertensão arterial sistêmica e diabete melitus tipo 2.

Findo o processo, o Juízo Executório requisitou novo monitoramento do quadro de saúde da paciente e, por conseguinte, sobreveio Laudo Pericial, através do qual a Juíza de primeiro grau entendeu ter havido negligência no seu tratamento, de forma a não fazer jus à manutenção de sua prisão domiciliar. Assim, impôs à apenada tratamento no interior do estabelecimento prisional, cassando a benesse.

Em seguida, a defesa interpôs agravo em execução em que pugnou a reforma da decisão.

O Tribunal de Justiça de Santa Catharina entendeu, por unanimidade dos votos, por manter incólume a decisão que revogou a prisão domiciliar concedida à agravante.

Diante do teor manifestamente ilegal do v. acórdão, a Defensoria impetrou habeas corpus com intuito de cessar o constrangimento ilegal suportado pela paciente, por nítida afronta ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. A impetração não foi conhecida pelo Eminente Ministro Relator, no Superior Tribunal de Justiça.

Em seguida, aviou-se agravo regimental, ao qual foi negado provimento pela Quinta Turma do STJ.

Diante de tal decisão, a defesa interpôs recurso ordinário constitucional destinado a essa Suprema Corte que, em análise monocrática do pleito, decidiu por obstar seu seguimento.

Com a devida vênia, tal decisão não merece prosperar, conforme será demonstrado a seguir.

 

DAS RAZÕES RECURSAIS

O presente agravo interno volta-se contra decisão que revogou a prisão domiciliar e restabeleceu o regime fechado para cumprimento de pena, sob o argumento de que há a possibilidade do controle das enfermidades apresentadas pela agravante no estabelecimento prisional, com oferta do tratamento adequado, entendendo-se ainda que ela não cuidou adequadamente de sua saúde quando em recolhimento domiciliar.

Objetiva-se o restabelecimento da prisão domiciliar humanitária, pois há hipervulnerabilidade da agravante, idosa, que está acometida por graves enfermidades, dependendo do uso contínuo de medicamentos, bem como tratamentos que incluem dieta e atividades físicas, conforme demonstrado no laudo pericial. Transcreve-se, em parte, o laudo que justificou a concessão da domiciliar:

“Quesito 5: esta paciente necessita de dieta com restrição de sódio, de carbohidratos e de exercício físico diário, podendo ter seu quadro agravado se mantida em reclusão.

Sendo assim recomendo a prisão domiciliar.” grifo no original

De início, cumpre pontuar que é admitida a concessão de prisão domiciliar ao condenado acometido por doença grave que necessite de tratamento médico que não possa ser oferecido no estabelecimento prisional ou em uma unidade hospitalar adequada. Ainda que a hipótese, in casu, não esteja abrangida pelo artigo 318 do Código de Processo Penal e artigo 117 da Lei Execuções Penais, a aplicação da benesse deve ser feita in bonam partem como necessária à preservação da humanidade da pena.

O Supremo Tribunal Federal teve oportunidade de apreciar o tema versado no presente recurso, na Ação Penal 863, de relatoria do Ministro Edson Fachin:

“Decisão: 1. Na data de hoje, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o agravo regimental oposto em face de decisão monocrática por mim proferida, que negou seguimento ao recurso de embargos infringentes manejados por Paulo Salim Maluf, manteve, por deliberação da maioria, a determinação de execução imediata da pena imposta, à unanimidade, pela Primeira Turma desta Suprema Corte. Pendia de julgamento o HC 152.707, da relatoria do eminente Ministro Dias Toffoli, no âmbito do qual Sua Excelência, por razões humanitárias, deferiu liminar para conceder ao acusado Paulo Salim Maluf o cumprimento da pena em regime de prisão domiciliar. Segundo Sua Excelência assentou em voto lido na sessão e distribuído ao pares na oportunidade, o deferimento da prisão domiciliar deu-se, precipuamente, pelas seguintes razões: Registro, primeiramente, que o exame dessas questões atinentes à execução da pena do paciente são de competência do eminente Ministro Edson Fachin, Relator da Ação Penal nº 863/SP, da qual ela provém, pois, consoante preconizado pelo art. 341, caput, do Regimento Interno, ´[o]s atos de execução e de cumprimento das decisões e acórdãos transitados em julgado serão requisitados diretamente ao Ministro que funcionou como Relator do processo na fase de conhecimento, observado o disposto nos arts. 38, IV, e 75 do Regimento Interno´. Todavia, longe de qualquer pretensão de me sobrepor a sua Excelência na análise dessas questões, consigno, expressamente, que minha excepcional atuação neste habeas, ao implementar a medida acauteladora, se deu tão somente em razão do caráter de urgência, considerado, em meu modo de ver, o agravamento superveniente dos problemas de saúde do paciente no cárcere, fato trazido a conhecimento da Corte em pleno feriado do dia 28 de março deste ano. (…) Não desconheço que a Lei de Execuções Penais apenas autoriza a prisão domiciliar para o condenado submetido ao regime prisional aberto e nas hipóteses ali previstas. Todavia, registro que a prisão domiciliar, por razões humanitárias, por força da matriz constitucional da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), encontra amparo jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal, inclusive para aqueles que cumprem pena em regime inicialmente fechado. Vide: “’HABEAS CORPUS’ – RECURSO ORDINÁRIO – PACIENTE RECOLHIDA AO SISTEMA PENITENCIÁRIO LOCAL – PRECÁRIO ESTADO DE SAÚDE DA SENTENCIADA, IDOSA, QUE SOFRE DE GRAVE PATOLOGIA CARDÍACA, COM DISTÚRBIOS NEUROCIRCULATÓRIOS – RISCO DE MORTE IMINENTE – COMPROVAÇÃO IDÔNEA, MEDIANTE LAUDOS OFICIAIS ELABORADOS POR PERITOS MÉDICOS, DA EXISTÊNCIA DE PATOLOGIA GRAVE E DA INADEQUAÇÃO DA ASSISTÊNCIA E DO TRATAMENTO MÉDICOHOSPITALARES NO PRÓPRIO ESTABELECIMENTO PENITENCIÁRIO A QUE RECOLHIDA A SENTENCIADAPACIENTE – EFETIVA CONSTATAÇÃO DA INCAPACIDADE DO PODER PÚBLICO DE DISPENSAR À SENTENCIADA ADEQUADO TRATAMENTO MÉDICO-HOSPITALAR EM AMBIENTE PENITENCIÁRIO – SITUAÇÃO EXCEPCIONAL QUE PERMITE A INCLUSÃO DA CONDENADA EM REGIME DE PRISÃO DOMICILIAR – OBSERVÂNCIA DO POSTULADO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO” (RHC nº 94.358/SC, Segunda Turma, Relator o Ministro Celso de Mello, DJe de 19/3/14). À luz desses fundamentos, destaco haver documentos juntados pela defesa que demonstram que o paciente (de 86 anos de idade), passa por consideráveis problemas relacionados à sua saúde no cárcere, em face de inúmeras e graves patologias que o afligem. Aliás, a notícia divulgada na manhã do dia 28 de março deste ano em respeitados veículos de comunicação da imprensa brasileira de que ele fora internado às pressas em hospital no fim da noite anterior, por complicações em seu estado de saúde corrobora os argumentos trazidos à colação pela defesa, bem como reforça, em meu juízo, a demonstração satisfatória, considerando os documentos que instruem o feito, da situação extraordinária autorizadora da prisão domiciliar humanitária na hipótese. Aliás, após minha decisão deferindo a liminar, veio aos autos laudo emitido em 28/3/18 pelo Instituto Médico Legal (IML) em que se conclui que o paciente apresentaria condições, após alta hospitalar, de cumprir pena em estabelecimento prisional, visto que o quadro de “osteoartrose avançada em coluna lombar (…) não se configura doença grave (…)” (Petição/STF nº 17893/18). Em sentido oposto, foi juntado aos autos relatório médico, datado de 1º/4/18, do qual se extrai a seguinte informação: “Atendi ao Sr. Paulo Salim Maluf, 86 anos com quadro agudo de broncopneumonia aspirativa, atrofia de membros inferiores devido à compressão de medula em raízes nervosas da coluna vértebra, câncer de próstata em fase de tratamento, perda da audição e perda da visão do olho direito e perda de sangue as evacuações: Melena, necessitando de internação hospitalar. Paciente deverá ser internado no Hospital Sírio Libanês com previsão de internação de 5 dias para realização de exames pertinentes e acompanhamento médico especializado. Solicito a V. Sª que essa internação possa ser autorizada o mais breve possível” (Petição/STF nº 18149/18). Por sua vez, o laudo médico a respeito das condições de saúde do paciente, emitido pelo diretor técnico do hospital onde permaneceu internado, consignou, em 2/4/18, que “o Sr. Paulo Salim Maluf, 86 anos, deu entrada na emergência deste Hospital, às 00h02 do dia 28/03/2018, trazido pela ambulância do SAMU e escoltado por dois agentes penitenciários, apresentando quadro de dor forte que começou na região lombar, irradiada para o membro inferior direito, dificultando a deambulação e postura na posição ereta. Foi atendido na emergência do PA, pelo Dr. Nickerson da Silva Lemos, CRM DF 20817, que registrou ‘quadro de lombociatalgia a direita, de início hoje sem histórico de trauma, dor com limitação funcional. Ao exame físico possui limitação para ortostatismo e lasague positivo, sendo realizado analgesia de urgência e solicito RNM da coluna lombar’. Foi medicado ainda na emergência (…). A ressonância da coluna lombar realizada ainda na emergência mostrou ‘estenose multifatorial do canal raquiano lombar, sobretudo nos níveis de L3-L4 e dos forames intervertrebrais lombares, acentuada em L3-L4, onde há compressão das raízes nervosas emergentes de L3 bilateral’[,] conforme cópia do prontuário em anexo. Devido ao quadro de dor forte e incapacitante, o paciente foi internado e medicado com analgésicos potentes, anti-inflamatórios, opioides, antieméticos e IBP (…). Ao longo do dia 28/03/2018, foi submetido à vários exames laboratoriais, resultados em anexo, inicialmente sem leucocitose e hematimetria normal. No início da noite, o paciente foi submetido ao procedimento de infiltração foraminal guiada por radioscopia da coluna lombar pelo Dr. Thiago Miller Santana Silva, CRM DF 18476, com descrição do procedimento, sob sedação e anestesia local, conforme prontuário em anexo. (…) Durante a madrugada do dia 29/03/2018, o paciente apresentou leve dificuldade respiratória, sendo necessário o uso de oxigênio suplementar, além de ter evoluído com distensão e desconforto abdominal. O mesmo queixou-se que já vinha com dificuldade para evacuar há 03 dias. Na manhã do dia 29/03/2018, o paciente apresentou vômitos, permanecendo em uso de oxigênio nasal. Diante desse quadro foi recomendado pelo médico clinico Dr. Tiago Christovão Tavares Pereira, CRM DF 12128, a realização de exames de imagens para avaliação de possíveis quadros de pneumonia e semi-oclusão intestinal. Os exames foram solicitados pela médica Dra. Nathalia Emanuelle Gasparini de Magalhães, CRM DF 20585. Tais exames, evidenciaram ectasia de esôfago e grande distensão gástrica, hérnia inguinal bilateral, maior a esquerda, sem indícios de obstrução. A tomografia do tórax evidenciou opacidades em vidro fosco, predominando nos lobos superiores, mais evidentes a esquerda, associada a lesão de pequenas vias aéreas, compatíveis com bronquiolite, de provável natureza inflamatória/infecciosa. No período da tarde, por volta das 16h, logo após a realização da tomografia computadorizada, apresentou vômito de cor escura, em grande quantidade, motivo pelo qual foi suspenso a dieta e solicitado exames complementares, dentre os quais: hemograma e bioquímica e também iniciado antibiótico, avalox intra venoso, em função do aspecto de bronquiolite no lobo superior do pulmão esquerdo, sugestivo de processo infeccioso. Ainda durante o período da tarde e da noite, apresentou vários episódios de vômitos, de cor escura com distensão abdominal acentuada, tendo feito lavagem intestinal, com diminuição da distensão e eliminação de grande quantidade de fezes de cor escura, tipo ‘borra de café’. Na manhã do dia 30/03/2018, foram solicitados novos exames de hemograma e bioquímica para avaliação da hematimetria, que evidenciaram leucocitose moderada, sem queda do hematócrito. Paciente apresentou melhora do quadro álgico lombar e irradiado, referindo apenas dor leve em membro inferior direito, mesmo após diminuição da analgesia endovenosa” (Petição/STF nº 18149/18). Concluiu o laudo em questão que, “[d]evido as múltiplas comorbidades e suspeita de hemorragia digestiva alta, em função dos episódios de vômito de cor escura, foi indicado o exame de endoscopia digestiva alta e continuidade do tratamento clínico (…)” (grifos nossos). Aliás, diante dos boletins médicos divulgados na imprensa nos últimos dias, é público e notório que o paciente está internado, em caráter de urgência, no Hospital Sírio Libanês desde 6 de abril passado. O relatório médico juntado aos autos pela defesa (Petição/STF nº 19842/18), que foi assinado pelo médico Sérgio Nahas (cirurgia do aparelho digestivo), com a assistência dos médicos Miguel Srougi (urologia), Ronaldo Kairalla (clínica médica e pneumologia), Roberto Basile Jr. (ortopedia) e Cyrillo Filho (hematologia), constatou, após avaliação desse grupo de especialistas, as seguintes patologias, que destaco, entre outras: (i) câncer de próstata recidivado e com metástases ósseas no sacro junto às raízes nervosas sacrais; (ii) incontinência urinária; (iii) cardiopatia; (iv) confusão mental; (v) alterações de cognição; (vi) depressão; (vii) alteração da marcha com perda de força muscular e atrofia em ambas as pernas, impossibilitando deambulação; (viii) condição de cadeirante, inclusive para as necessidades fisiológicas básicas; (ix) anemia ferropriva; (x) imunossupressão; (xi) síndrome paraneoplásica manifestada por monilíase esofágica e trombose venosa profunda de membro inferior esquerdo; (xii) broncopneumonia aspirativa com infiltrado pulmonar bilateral; (xiii) osteoporose e degenerações da coluna em diferentes graus de corpos vertebrais e articulações interfacetárias; e (xiv) hemorragia digestiva alta: melena. Prossegue o laudo médico com as seguintes informações: “De acordo como a anamnese realizada e frente às falências instaladas houve uma priorização na realização de exames laboratoriais e complementares por imagem, principalmente devido ao estado debilitado em que se encontrava o paciente. Igualmente iniciamos tratamento clínico medicamentoso em áreas mais agudas e críticas. A recuperação mínima que se deseja deverá ser alcançada após tratamento em regime hospitalar durante aproximadamente 7 dias, estendendo-se por mais 90 a 120 dias de tratamento ambulatorial para recuperação e reabilitação de déficits adquiridos recentemente” (grifos nossos). Em destaque, reiteram as autoridades médicas que “este tratamento, frente à idade de 86 anos e às condições clínicas atuais em que se encontra o paciente, deverá ser realizado em ambiente adequado para sua sobrevivência. Caso contrário sua condição de vida será abreviada” (grifos nossos). Reafirmo, portanto, haver neste exame demonstração suficiente de que o paciente padece de graves patologias. (…) Amparado nesses valores constitucionais da República Brasileira, bem como nos dispositivos legais já citados, proponho o referendo da decisão liminar proferida, permitindo-se ao paciente cumprir sua pena em regime de prisão domiciliar. Fica registrado, a toda evidência, que o cumprimento de pena em prisão domiciliar não obsta a que o paciente se submeta a tratamento ambulatorial ou hospitalar, mediante internação, dada a gravidade de seu estado de saúde, com a devida supervisão do juízo de execução competente e do Ministro Relator da AP nº 863/SP. Como autoridade judiciária competente para fiscalizar a prisão domiciliar do paciente, proponho o Juízo das Execuções Penais da Comarca de São Paulo, pois é incontroverso que, na condição de Deputado Federal pelo Estado de São Paulo, o paciente mantém naquela comarca seu domicílio voluntário, vale dizer, local onde estabeleceu a sua residência com animus definitivo (CC, art. 70). 2. Como anunciei oralmente na sessão, na condição de Relator da AP 863, encampo os fundamentos trazidos por Sua Excelência e defiro, nos exatos termos ali expostos, a execução penal do sentenciado Paulo Salim Maluf, por razões humanitárias, em regime de prisão domiciliar. Assento, todavia, uma vez mais, que o tema relativo à prisão domiciliar em nenhum momento foi trazido a mim para deliberação, o que fiz, e referendo, pela primeira vez na data de hoje. Comunique-se o Juízo da execução competente. Publique-se. Intimem-se. Brasília, 19 de abril de 2018. Ministro Edson Fachin Relator Documento assinado digitalmente” (AP 863, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, julgado em 19/04/2018, publicado em DJe-077 DIVULG 20/04/2018 PUBLIC 23/04/2018) grifo nosso 

É cediço que o cenário prisional brasileiro é caótico, insalubre, e carece de mínimas condições humanas para o cumprimento da penitência, pelo que não há compatibilidade do tratamento de saúde em situações de grande vulnerabilidade. Como já reconhecido por essa Suprema Corte, quando do julgamento da medida cautelar na ADPF 347, o sistema carcerário submete seus internos à reiterada violação de direitos fundamentais.

Portanto, a manutenção da agravante presa é inadequada ao tratamento diário de uma enfermidade grave, que necessita não apenas de medicamentos, mas também de alimentação adequada e locais próprios à prática de atividades físicas.

Tecidas as considerações acima, cumpre refutar as razões invocadas para a revogação da prisão domiciliar. Afirmou a Magistrada de Primeiro Grau que a agravante não estava cuidando adequadamente de sua saúde, pelo que a razão da domiciliar não mais prevalecia. O mesmo fundamento foi invocado em todas as instâncias posteriores.

A análise médica que serviu de esteio para a cassação da domiciliar está acostada aos autos:

“(…) o quadro da paciente é compatível com patologias as quais não estão sendo adequadamente tratadas, ainda que em domicílio, seja por falta de orientação ou discernimento, por falta de preenchimento, ou ainda administração inadequada dos medicamentos. Consta ainda um receituário com medicamentos anti hipertensivos com os dizeres “falta”. Fator este que pode corroborar o uso inadequado dos medicamentos em questão. (…)” grifo nosso

Em suma, ao que tudo indica, os medicamentos para hipertensão estavam em falta, segundo o próprio médico que elaborou a análise. Parece inconcebível que a pessoa pobre, além de não receber o tratamento de saúde adequado por parte do Estado, seja, em razão disso, punida com o retorno à prisão.

O cenário atual do sistema de saúde brasileiro é caótico, dados o aumento de demanda, o agravamento da miséria, a pobreza e o maciço desemprego.

Como já informado, a agravante está com 74 (setenta e quatro) anos de idade e a solução encontrada para o descaso do Estado não pode ser seu recolhimento à prisão, o que, aliás, contraria o primeiro laudo médico acostado aos autos.

Deve, portanto, ser exercido o juízo de reconsideração ou provido o agravo para, ao final, prover-se o recurso ordinário em habeas corpus, permitindo-se o retorno da agravante à prisão domiciliar.

 

DA SUSTENTAÇÃO ORAL EM AGRAVO REGIMENTAL

O presente recurso ordinário foi interposto em favor de pessoa maior de 74 anos, acometida de grave enfermidade e presa.

Portanto, estão presentes três fatores que tornam a causa urgente e de enorme relevância.

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o agravo regimental no HC 165973, de relatoria do Ministro Edson Fachin, na sessão 25 de junho de 2019, permitiu a realização de sustentação oral por parte do advogado do paciente/agravante.

Assim, pugna a Defensoria Pública da União pelo julgamento presencial do agravo e que seja possibilitado o uso da palavra para a manifestação oral.

 

CONCLUSÃO. PEDIDO

Ante o exposto, roga por urgência na apreciação do feito por tratar-se a agravante de pessoa maior de 74 anos.

Requer seja exercido o juízo de retratação por Vossa Excelência, com a concessão da ordem, o desconto da pena em regime domiciliar.

Caso mantida a decisão agravada, seja o presente agravo levado à Turma em julgamento presencial e em destaque, possibilitando-se ainda a sustentação oral, para que esta dê provimento ao recurso e conceda a ordem.

Pugna, ainda, exercida a reconsideração, o que se espera que ocorra, pela intimação pessoal da Defensoria Pública-Geral da União para a sessão de julgamento do writ.

 

Levando bronca

Levando bronca

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

O que vou contar agora aconteceu no final de 2009, quando eu tinha quase três anos de atuação perante o STF, representando a DPU.

O Ministro Celso de Mello intimou a Defensoria Pública da União para o julgamento de um habeas corpus, o que era pouco comum, uma vez que ele sempre levava os processos em mesa, sem aviso prévio.

Antes do início da sessão da Segunda Turma, como é a praxe do STF, eu me inscrevi para fazer a sustentação oral no caso.

A Ministra Ellen Gracie presidia a sessão. Ao apregoar o HC, ela falou o número do processo, o relator, e o nome do paciente, mas não avisou que haveria sustentação oral.

Eu me dirigi à tribuna para aguardar a leitura do relatório pelo Ministro Celso de Mello.

O Ministro começou a ler de cabeça baixa, sem olhar para mim. O tempo foi passando e ele lia sem parar seu relatório.

De repente, uma dúvida me assaltou: e se ele estiver votando? Eu não ouvi ele falar que passaria ao voto, mas um relatório tão longo em um tema nem tão diferente assim? Devo interromper?

Enquanto isso, ele continuava sua leitura.

Pensei: não é possível, não existe relatório de HC desse tamanho, ele está votando.

Interrompi:

“Excelências, pela ordem, eu pretendo fazer sustentação oral.”

O Ministro:

“Eu sei, estou lendo o relatório.”

“Desculpe-me, Excelência, fiquei em dúvida.”

A partir daí, a cada 4 frases que o Ministro falava, ele levantava a cabeça, me olhava, e dizia:

“Ainda estou lendo o relatório.”

Foi bem embaraçoso, pois eu já tinha entendido, mas não tinha jeito:

“Ainda estou fazendo o relatório.”

Assim foi até ele acabar o relatório (votos longos não são exclusividade da TV Justiça, como já falei algumas vezes).

Quando a palavra foi passada a mim, iniciei pedindo desculpas pelo equívoco. Gaguejei um bocado, mais que nas primeiras vezes em que sustentei oralmente, mas depois me acalmei.

Estar ali é aceitar se expor, mas foi bem constrangedor, confesso.

Brasília, 2 de março de 2019

Atualização: faltou dizer que a ordem foi denegada.

 

Prisão cautelar e celeridade processual 

Prisão cautelar e celeridade processual 

 

O texto abaixo foi redigido pela minha colega, Dra. Tatiana Melo Aragão Bianchini, que proferiu sustentação oral no HC 145359, perante a 1ª Turma do STF.

A modéstia dela impediu que ela colocasse seu nome como responsável pela sustentação, essencial para a concessão da ordem por empate na votação.

A discussão veiculada no habeas corpus em questão era de excesso de prazo em prisão cautelar, tendo sido deferida liminar pelo Ministro Marco Aurélio, relator.

Na sessão de julgamento, ouvida a Defensoria Pública da União, na pessoa da colega, o Ministro Marco Aurélio confirmou a liminar e concedeu a ordem.

Os Ministros Rosa Weber e Roberto Barroso votaram por sua denegação. O Ministro Luiz Fux estava ausente.

O Ministro Alexandre de Moraes cogitou em denegar e determinar o julgamento célere. Ao ouvir isso, a Dra. Tatiana Bianchini fez essencial intervenção para apontar a fase atual do processo e a data da próxima audiência. Vejam abaixo.

Gustavo de Almeida Ribeiro

Brasília, 7 de janeiro de 2019

 

 

“Trata-se de habeas corpus no qual é pleiteada a liberdade provisória do paciente, preso preventivamente por garantia da ordem pública em 29/05/2015, acusado da prática do delito de homicídio qualificado (art. 121, §2º, I, III e IV, do CP) e também do crime previsto no art. 14 da Lei nº 10.826/2003. A custódia cautelar foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Piauí e pelo Superior Tribunal de Justiça.

Em que pese ter permanecido preso à disposição do juízo por longo período, o feito não chegou a seu termo, tendo o Ministro Marco Aurélio, em 26/06/2017, deferido liminar – que estendeu também ao corréu, na qual destacou que “O paciente está preso, sem culpa formada, há 2 anos e 27 dias. Nada justifica tal fato. Surge o excesso de prazo. Privar da liberdade, por tempo desproporcional, pessoa cuja responsabilidade penal não veio a ser declarada em definitivo viola o princípio da não culpabilidade. Concluir pela manutenção da medida é autorizar a transmutação do pronunciamento mediante o qual implementada, em execução antecipada de sanção, ignorando-se garantia constitucional”.

No último dia 27/11/2018 o caso foi levado à apreciação da Primeira Turma, que após sustentação oral da Defensoria Pública da União, por empate na votação, concedeu a ordem nos termos do voto do Relator, o Ministro Marco Aurélio, sendo de se destacar que a movimentação processual da ação penal, disponível no Sistema Themis Web – Consulta Pública, do TJPI na internet, demonstrou que a instrução ainda não havia sido encerrada, constando de referida movimentação que em outubro/2017 a audiência de instrução e julgamento foi redesignada para o dia 09/09/2020.

Em que pese a gravidade dos fatos imputados ao paciente, a situação posta, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas (CF, art. 5º, LXXVIII). Ademais, diverge frontalmente do quanto declarado na Convenção Americana sobre Diretos Humanos, adotada no Brasil através do Decreto n. 678/92, a qual consigna a ideia de que toda pessoa detida ou retida tem o direito de ser julgada dentro de um prazo razoável ou ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo.​”

Para quem quiser conferir, segue trecho do andamento extraído do sítio eletrônico do TJPI ( Comarca de Teresina, processo 0020092-04.2014.8.18.0140)

Andamento processual na origem. Comarca de Teresina/PI. A data na coluna da esquerda indica o dia em que lançada a movimentação.

A “mula” no tráfico de drogas e a fração obrigatória

A “mula” no tráfico de drogas e a fração obrigatória

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Quem já leu alguns de meus textos sabe que reiteradamente eu reclamo do excesso de decisões monocráticas, que impedem a sustentação oral, a discussão presencial dos julgadores e a presença das partes durante a prolação dos votos (os dois últimos em caso de julgamento virtual, regra geral atual).

Enfrento diariamente temas repetidos, comuns. Todavia, há muitos que fogem ao padrão, que têm aspecto peculiar distintivo que justificaria tratamento especial.

Uma de minhas dificuldades é escolher o que vale a pena agravar (pelas mais diversas razões que mereceriam texto próprio), a outra é como tirar esse agravo da vala comum, das centenas de feitos julgados rapidamente.

Abaixo, seguem as razões de um agravo interno apresentado recentemente (em 13/08/2018) em que questiono a fração obrigatória de 1/6 para a redução da pena, resultante da aplicação do §4º do artigo 33 da Lei de Drogas para a chamada “mula” do tráfico.

Constato, em minha atuação, que tal fator de redução tem sido usado quase que obrigatoriamente em se tratando de “mula”, o que me parece ser contrário ao princípio da individualização da pena.

Gostaria de ter chance de ler esses julgados todos do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que invoco no texto e perguntar se realmente toda “mula” é igual.

Segue a fundamentação do recurso.

Brasília, 14 de agosto de 2018

 

 

Razões recursais (HC 157831/STF)

 

O presente agravo volta-se contra decisão monocrática que manteve e entendeu correta a fração mínima fixada para redução de pena no tráfico de drogas pelo qual foi condenada a agravante.

A defesa não desconhece o entendimento pacificado do Supremo Tribunal Federal no sentido de não haver direito subjetivo à redução máxima, mesmo quando preenchidos os requisitos cumulativos do §4º do artigo 33 da Lei 11.343/06; todavia, o que tem ocorrido, em verdade, em se tratando de pessoa considerada “mula” do tráfico é o posicionamento no sentido diametralmente oposto. Ou seja, essa simples condição vem sendo invocada para se impor a redução mínima de 1/6 (um sexto), restando desconsideradas outras circunstâncias. Há portanto, verdadeira tarifação na situação, o que afasta a individualização da pena no que concerne ao presente aspecto.

O caso em exame é propício à análise do tema, uma vez que a agravante portava pequena quantidade de droga, se considerado o tráfico internacional, mais caro para seu desenvolvimento. Mesmo assim, foi beneficiada com apenas 1/6 da redutora, fração que tem sido invocada em quase todos os casos assemelhados. Destaca-se que a paciente portava apenas 289,5 (duzentos e oitenta e nove vírgula cinco) gramas de cocaína.

O tráfico internacional tem punição maior que o tráfico local. Em suma, o legislador já tratou de piorar a situação daqueles que se envolvem com esse tipo de conduta. Não se descura que ele exige preparação maior, maior dispêndio. A discussão está em saber se a pessoa que simplesmente adere a uma estrutura já montada e que dela faz uso como peça descartável, substituível, merece sempre, independentemente de outras considerações, a redução em seu percentual mínimo.

A agravante, que até 1º de agosto de 2018, descontava sua pena em regime fechado – apesar de estar em regime semiaberto, sendo transferida nessa data, portava pequena quantidade de droga. Logo, não pode ser confundida com alguém experiente ou capaz de difundir grande volume de entorpecente (já considerado que o tráfico internacional movimenta quantidades maiores).

Assim, impende seja provido o presente agravo, sendo concedida a ordem à paciente, aumentando-se o percentual de 1/6 para a redução, uma vez que sua conduta não só não desbordou do que normalmente ocorre em casos assemelhados, mas, em verdade, ficou aquém pela quantidade. Deve ser afastada a dosimetria automática que chega à redução sempre igual, quando preenchidos os requisitos legais. Os julgados abaixo colacionados, provenientes do Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, confirmam o alegado, ou seja, preenchidos os requisitos legais (artigo 33, §4º da Lei 11.343/06), a redução será de 1/6, sendo desconsiderados outros fatores (são pródigos os resultados assemelhados aos ora apresentados):

 

“PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. AFASTAMENTO DE VIOLAÇÃO RECONHECIDA PELO C. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA AO ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/2006, PARA QUE SEJA UTILIZADA A QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA EM APENAS UMA DAS ETAPAS DO CÁLCULO DA REPRIMENDA. NOVA DOSIMETRIA PENAL.

– Diante do comando emitido pelo C. Superior Tribunal de Justiça, no bojo do Agravo em Recurso Especial nº 676.345/SP, determinou-se a realização de nova dosimetria da pena imposta ao acusado para afastar violação reconhecida ao art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, utilizando-se a quantidade de droga apreendida em apenas uma das etapas do cálculo da reprimenda.

– A norma inserta no art. 42 da Lei nº 11.343/2006 elenca circunstâncias que preponderam sobre as mencionadas no art. 59 do Código Penal quando da fixação da pena base, cabendo especial destaque a natureza e a quantidade de droga traficada.

– O acusado foi preso em flagrante delito na posse de 25 kgs de cocaína e mais de 1 kg de haxixe, o que ensejou a fixação de pena base, quando do julgamento do recurso de Apelação aviado pelo Ministério Público Federal, na casa de 08 anos de reclusão e 800 dias-multa, patamar este que até mesmo se encontra abaixo do que a 11ª Turma desta C. Corte Regional imporia para situações semelhantes à retratada nestes autos. Entretanto, ante a impossibilidade de se proceder para o fim de agravar a reprimenda imposta ao acusado pela existência de recurso da defesa que ensejou a anulação da dosimetria então executada (vedação à reformatio in pejus indireta), de rigor a manutenção da pena base nos mesmos níveis outrora delimitados.

– Deve ser mantido o assentamento da atenuante da confissão (no patamar de 1/6), até mesmo diante do fato de que o Parquet federal (único a interpor recurso de Apelação) não se insurgiu contra tal aspecto constante da r. sentença penal condenatória.

– Imperiosa a incidência da causa de aumento de pena elencada no art. 40, I, da Lei nº 11.343/2006, na justa medida em que restou comprovado que o acusado recebeu a substância entorpecente no Paraguai e a transportava para São Paulo. Aplicação da fração ampliativa de 1/6.

– A causa de diminuição de pena elencada no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, prevê a possibilidade de redução de 1/6 a 2/3 da reprimenda para o agente primário, possuidor de bons antecedentes, que não se dedique a atividades criminosas e não integre organização criminosa. Há de se ressaltar, de início, que os fins econômicos do transporte de droga demonstram a existência de uma atividade ou de uma organização criminosa necessariamente subjacente. Diferente seria a hipótese daquele que transporta drogas para entregar a terceiros por questões divorciadas de qualquer sentido econômico, situação que, de plano, ensejaria a aplicação da causa de diminuição em questão.

– No caso em tela, é fato que o acusado aderiu de modo eventual às atividades da organização criminosa com o objetivo de efetivar o crime de tráfico de drogas que estava em curso quando de sua prisão em flagrante, mesmo que se considere que sua participação estava adstrita ao transporte da substância entorpecente. A discussão concentra-se, então, se existem elementos que indiquem seu pertencimento à organização criminosa, ou seja, diferenciar se tal adesão se deu de maneira absolutamente pontual e específica, ou, se ao contrário, denota-se participação com vínculo mínimo de estabilidade, conhecimento a respeito da organização e pertencimento ao grupo criminoso.

– O fato de ter aceitado prestar um serviço à organização criminosa, in casu, o transporte da droga, não significa, por si só, que o transportador seja um membro desta organização e, no caso concreto, não existem provas ou quaisquer indícios de efetivo pertencimento à organização criminosa. Os elementos constantes dos autos dão conta de que o acusado pode ser classificado como “mula”, pessoa contratada de maneira pontual com o objetivo único de efetuar o transporte de entorpecentes. Estas pessoas, via de regra, não possuem a propriedade da droga nem auferem lucro direto com a sua venda, não tendo maior adesão ou conhecimento profundo sobre as atividades da organização criminosa subjacente, limitando-se a transportar drogas a um determinado destino. Não existem dados, tampouco, de realização de outras viagens internacionais em nome do réu, o que também indica que sua atuação como “mula” ocorreu de forma esporádica e eventual, diferenciando-se do traficante profissional que se utiliza do transporte reiterado de drogas como meio de vida.

Mostra-se cabível, portanto, a aplicação da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, que deve, entretanto, ser fixada no mínimo legal, ou seja, 1/6, e não na fração máxima prevista no dispositivo (2/3), nitidamente reservada para casos menos graves, a depender da intensidade do auxílio prestado pelo réu. In casu, o acusado atuou em favor de uma organização criminosa internacional, contribuindo, ainda que de maneira eventual, com suas atividades ilícitas. De fato, ao aceitar a proposta de transporte de drogas ao exterior, o réu tinha ciência de sua colaboração decisiva para o sucesso do grupo, em pelo menos dois continentes.

– Regime inicial de cumprimento de pena fixado no semiaberto. Impossível a substituição da pena corporal por restritivas de direito à míngua do preenchimento dos requisitos legais.

– Dado provimento ao recurso de Apelação interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, corrigindo, por força do comando exarado pelo C. Superior Tribunal de Justiça, a dosimetria penal para fixar a reprimenda imposta ao acusado CRISTIANO DOS SANTOS LIMA em 06 anos, 05 meses e 23 dias de reclusão, em regime inicial SEMIABERTO, e em 647 dias-multa, cada um no valor de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos.” (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA,  Ap. – APELAÇÃO CRIMINAL – 52290 – 0002674-70.2011.4.03.6005, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 24/07/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/08/2018 ) grifo nosso

 

 

“PENAL. PROCESSO PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. DOSIMETRIA. PENA-BASE. ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA. ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONTÂNEA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, §4º, DA LEI DE DROGAS. FRAÇÃO MÍNIMA. TRANSNACIONALIDADE. REGIME INICIAL SEMIABERTO. INCABÍVEL SUBSTITUIÇÃO DA PENA.

  1. Autoria e materialidade demonstradas.
  2. Na primeira fase, justifica-se a fixação da pena acima do mínimo legal, em razão da quantidade e natureza da droga. Entretanto, à míngua de recurso da defesa para reduzir a fração de aumento, mantenho a pena-base conforme fixada na sentença, em 7 (sete) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa.
  3. Na segunda fase, incide a atenuante da confissão espontânea e, da mesma forma, por não ter se insurgido a defesa, mantenho a pena intermediária conforme fixada na sentença, em 6 (seis) anos de reclusão e 600 (seiscentos) dias-multa.
  4. O réu é primário e sem antecedentes criminais. Não há nos autos indícios satisfatórios de que integrasse organização criminosa ou fizesse do tráfico de drogas seu meio de vida. Faz jus, portanto, à redução de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, na fração mínima de 1/6 (um sexto), considerando que as passagens aéreas e a hospedagem no Brasil foram custeadas pela pessoa que o contratou para o transporte da droga. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o conhecimento pelo agente de estar a serviço do crime organizado para o tráfico transnacional de entorpecentes constitui fundamento concreto e idôneo a ser valorado para fins de estabelecimento da incidência da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, no mínimo legal, ante a gravidade da conduta perpetrada (STJ, HC n. 387.077, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 06.04.17). A pena resultante dessa redução é de 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
  5. A transnacionalidade do delito está demonstrada. A versão apresentada pelo réu de que não pretendia embarcar com a droga, mas tão somente entregá-la a um desconhecido na fila do check-in não é crível e tampouco foi comprovada. Assim, majoro a pena em 1/6 (um sexto), do que resulta a pena de 5 (cinco) anos, 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa.
  6. De ofício, estabeleço o regime inicial semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º, b, do Código Penal, pois não há circunstâncias judiciais subjetivas desfavoráveis que justifiquem a fixação de regime mais gravoso.
  7. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, porquanto não preenchido o requisito previsto no art. 44, I, do Código Penal.
  8. Apelação desprovida. Fixado o regime inicial semiaberto de ofício.” (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, Ap. – APELAÇÃO CRIMINAL – 75249 – 0004467-80.2017.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, julgado em 25/06/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/06/2018 ) grifo nosso

 

 

“PENAL. PROCESSO PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ART. 33, CAPUT, E 40, I, DA LEI N.º 11.343/06. 1.088 GRAMAS DE COCAÍNA. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMOSNTRADAS. PENA-BASE. MÍNIMO LEGAL. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. SÚMULA N. 231 DO STJ. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO § 4º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/06. FRAÇÃO MÍNIMA. TRANSNACIONALIDADE. REGIME INICIAL SEMIABERTO. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. INCABÍVEL. PRISÃO PREVENTIVA. MANTIDA. PENA DE MULTA.

  1. Materialidade e autoria demonstradas.
  2. A natureza e a quantidade da droga são critérios importantes para a fixação da pena inicial a ser aplicada ao crime de tráfico, conforme previsto no art. 42 da Lei n. 11.343/06. No caso, considerando que o acusado transportava 1.088g (mil e oitenta e oito gramas) de cocaína, é justificável a fixação da pena-base no mínimo legal, em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
  3. Na segunda fase, incide a atenuante da confissão espontânea; entretanto, observado o disposto na Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, a pena é mantida no mínimo legal de 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
  4. O réu é primário e sem antecedentes criminais. Consta da certidão de movimentos migratórios apenas a entrada no País no dia 07.05.17, ou seja, três dias antes da prisão em flagrante (fl. 22). Não há nos autos indícios satisfatórios de que integrasse organização criminosa ou fizesse do tráfico de drogas seu meio de vida. Faz jus, portanto, à redução de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06, na fração mínima de 1/6 (um sexto), considerando as circunstâncias subjacentes à prática delitiva. No caso, a droga estava oculta em um fundo falso. Ademais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o conhecimento pelo agente de estar a serviço do crime organizado para o tráfico transnacional de entorpecentes constitui fundamento concreto e idôneo a ser valorado para fins de estabelecimento da incidência da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 no mínimo legal, ante a gravidade da conduta perpetrada (STJ, HC n. 387.077, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 06.04.17). A pena resultante dessa redução é de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão e 416 (quatrocentos e dezesseis) dias-multa.
  5. A transnacionalidade do delito majora a pena em 1/6 (um sexto), perfazendo a pena definitiva de 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, no valor unitário mínimo.
  6. Estabeleço o regime inicial semiaberto, nos termos do art. 33, § 2º, b, do Código Penal.
  7. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, à míngua do preenchimento do requisito previsto no art. 44, I, do Código Penal.
  8. Subsistem os motivos para a manutenção da prisão preventiva, nos termos da sentença de fls. 139/154v., motivo pelo qual indefiro o pedido para recorrer em liberdade. Frise-se, contudo, que embora mantida a prisão preventiva, o réu deve ser incluído no regime semiaberto.
  9. Mantenho a condenação à pena de multa, uma vez que o preceito secundário do art. 33 da Lei n. 11.343 /06 prevê sua aplicação de forma cumulativa com a pena privativa de liberdade. É facultado, contudo, o seu parcelamento, nos termos do art. 169 da Lei n. 7.210/84, a critério do Juízo da Execução.
  10. Apelos desprovidos.” (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, Ap. – APELAÇÃO CRIMINAL – 74691 – 0003684-88.2017.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, julgado em 23/04/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/05/2018 ) grifo nosso

 

 

“PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES. LEI Nº 11.343/06. MATERIALIDADE INCONTROVERSA. AUTORIA PARCIALMENTE DEMONSTRADA. DOSIMETRIA. REVISÃO.

1- Materialidade delitiva que, além de incontroversa, foi demonstrada pela prova documental (auto de apreensão), pericial (laudos químicos) e pela prova testemunhal, tudo a confirmar que a substância apreendida na bagagem de uma das rés era cocaína, com massa líquida total de 13.450g (treze mil quatrocentos e cinquenta gramas), substância entorpecente cuja posse e transporte, entre outras condutas a ela relacionadas, são proibidos em território nacional (Portaria SVS/MS 344/98; Lei 11.343/06, art. 33, caput).

2- Consoante o artigo 40, I, da Lei n° 11.343/2006, é necessário somente que “a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciem a transnacionalidade do delito”, e não que haja a efetiva transposição de fronteiras entre os países, para que se reconheça o caráter transnacional da conduta. Hipótese em que a substância entorpecente foi apreendida na bagagem de uma das acusadas, já no Aeroporto Internacional de Guarulhos, momentos antes do embarque em voo com destino final em Moçambique.

3- Autoria que restou demonstrada apenas em relação a uma das acusadas. Circunstâncias que não permitem concluir de maneira inconteste pela participação de ambas na empreitada criminosa. Ante a fragilidade do conjunto probatório e da fundada dúvida, de rigor a absolvição com fundamento no artigo 386, VII, do CPP.

4- Dosimetria da pena. Revisão.

4.1- Redução da pena-base em atenção aos parâmetros fixados no âmbito deste órgão fracionário, considerando a quantidade a natureza da substância entorpecente apreendida.

4.2- Reconhecida a atenuante da confissão espontânea, pois a acusada, embora tenha afirmado não ter certeza do conteúdo das bolsas que levaria para Moçambique, confirmou em detalhes o desenrolar do iter criminis e assumiu o elemento subjetivo em sua conduta, ao menos, na modalidade do dolo eventual.

4.3- Reconhecida a incidência da causa de diminuição do art. 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, em sua mínima fração.

4.4- Fixado o regime semiaberto para início de cumprimento da pena, levando em conta que as circunstâncias judiciais não impõem a fixação de regime mais gravoso que a regra legal.

5- Apelo de uma das rés provido para reformar a sentença e absolver a acusada.

6- Apelo da segunda ré parcialmente provido, apenas para reduzir a pena imposta.” (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA,  Ap. – APELAÇÃO CRIMINAL – 74152 – 0003291-66.2017.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI, julgado em 10/04/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/04/2018 ) grifo nosso

 

 

“PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ART. 33, CAPUT, E 40, I E V, DA LEI N.º 11.343/06. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. DOSIMETRIA. PENA-BASE. MÍNIMO LEGAL. ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/06.  UM SEXTO. TRANSNACIONALIDADE E TRÁFICO ENTRE ESTADOS DA FEDERAÇÃO. AUMENTO MANTIDO. REGIME INICIAL SEMIABERTO. INCABÍVEL A SUBSTITUIÇÃO POR PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS.

  1. Materialidade e autoria demonstradas.
  2. Dosimetria. Na primeira fase, justifica-se a fixação da pena-base no mínimo legal, em 5 (cinco) anos de reclusão, tendo em vista a quantidade e a natureza da droga apreendida, 2.073g (dois mil e setenta e três gramas), massa bruta, de cocaína.
  3. Na segunda fase, não se insurgem as partes contra a não incidência da atenuante da confissão espontânea. Ademais, observada a Súmula n. 231 do Superior Tribunal de Justiça, a pena intermediária deverá ser mantida no mínimo legal, em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa.
  4. Na terceira fase, incide a causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06. O réu é primário e sem antecedentes criminais. Não há nos autos indícios satisfatórios de que integrasse organização criminosa ou fizesse do tráfico de drogas seu meio de vida. Contudo, dadas as circunstâncias subjacentes à pratica delitiva, consistentes na ocultação da droga em fundo falso, deve ser aplicado o redutor na fração mínima. Ademais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o conhecimento pelo agente de estar a serviço do crime organizado para o tráfico transnacional de entorpecentes constitui fundamento concreto e idôneo a ser valorado para fins de estabelecimento da incidência da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/06 no mínimo legal, ante a gravidade da conduta perpetrada (STJ, HC n. 387.077, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 06.04.17). Faz jus, portanto, à redução da pena na fração mínima de 1/6 (um sexto), do que resulta a pena de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de reclusão e 416 (quatrocentos e dezesseis) dias-multa.
  5. Mantenho o aumento de 1/6 (um sexto) relativo às da causas de aumento do art. 40, I e V, da Lei n. 11.343/06. Anoto que a defesa não recorre para afastar a causa de aumento relativa ao exercício do tráfico entre Estados da Federação.
  6. Torno a pena definitiva em 4 (quatro) anos, 10 (dez) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 485 (quatrocentos e oitenta e cinco) dias-multa, no valor unitário mínimo.
  7. Regime inicial semiaberto.
  8. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, porquanto não preenchido o requisito objetivo previsto no art. 44, I, do Código Penal.
  9. Apelação provida em parte.” (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, Ap. – APELAÇÃO CRIMINAL – 74002 – 0011140-47.2016.4.03.6112, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, julgado em 19/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/03/2018 ) grifo nosso

 

 

“PENAL. PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ARTIGO 33, C/C ARTIGO 40, I, DA LEI Nº 11.343/06. PEDIDO DE PRISÃO AFASTADO. MATERIALIDADE E AUTORIA INCONTESTES. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE MANTIDA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA RECONHECIDA. REDUÇÃO DA FRAÇÃO DA BENESSE DO ARTIGO 33, § 4º, DA LEI DE DROGAS. INTERNACIONALIDADE DELITIVA. REGIME INICIAL ALTERADO. IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA REPRIMENDA POR PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. PENA DE MULTA REDIMENSIONADA. RECURSO PROVIDO EM PARTE.

  1. Pedido de restabelecimento da prisão do réu não acolhido. Fatos que levaram à revogação da prisão preventiva inalterados. Preliminar rejeitada.
  2. Tráfico internacional de entorpecente. Prisão em flagrante. Apreensão de cocaína. Materialidade e autoria incontroversas.
  3. Condenação mantida.
  4. Dosimetria da pena.
  5. Pena-base mantida.
  6. Atenuante da confissão adequadamente reconhecida. Apesar do reconhecimento da atenuante, a reprimenda não foi reduzida, em observância ao que preceitua a Súmula 231, do STJ.
  7. Manutenção da causa de diminuição do artigo 33, § 4º, da Lei de Drogas, mas tão somente em 1/6.
  8. Causa de aumento do artigo 40, I, da Lei nº 11.343/06 reconhecida. Majoração mantida em 1/6.
  9. Pena de multa redimensionada.
  10. Fixação do regime inicial semiaberto.
  11. Ausência dos requisitos para a substituição da reprimenda por penas restritivas de direitos.
  12. Recurso parcialmente provido.” (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, Ap. – APELAÇÃO CRIMINAL – 72846 – 0013419-82.2016.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, julgado em 19/02/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/02/2018 ) grifo nosso

 

 

“PENAL. PROCESSUAL PENAL. ARTIGO 33, CAPUT, C/C ARTIGO 40, I, DA LEI DE DROGAS. MATERIALIDADE E. AUTORIA DEMONSTRADA. DOSIMETRIA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ARTIGO 33, §4, DA LEI DE DROGAS FIXADA EM PERCENTUAL COMPATÍVEL COM AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO. DETRAÇÃO. REGIME INICIAL. PARCIAL PROVIMENTO.

  1. Materialidade e autoria demonstradas.
  2. Na primeira fase da dosimetria da pena, além das circunstâncias judiciais do artigo 59 do Código Penal, deve ser considerado preponderantemente, nos termos do art. 42 da Lei 11.343/2006, o grau de reprovabilidade da conduta, aferido pela nocividade e quantidade de tóxico que se buscou transportar.
  3. A qualidade e a quantidade do entorpecente apreendido, in casu, impedem que a pena-base seja fixada no mínimo legal. Pena-base mantida nos termos fixados na r. sentença.
  4. Conforme reconhecido em sentença, o réu tem direito à incidência da atenuante da confissão, pois, a despeito de ter sido preso em flagrante, confessou, em juízo, a autoria dos fatos a si imputados, o que inclusive foi usado para embasar a condenação. Mantida a aplicação da atenuante, fixando, contudo, a redução na fração de 1/6 (um sexto), patamar razoável para o caso.
  5. Da causa da diminuição 33, §4º, da Lei de Drogas. O réu é primário e não ostenta maus antecedentes. Ademais, as circunstâncias do caso concreto não permitem concluir que o acusado dedicava-se à atividade de organização criminosa.
  6. É de se destacar que embora as “mulas” sejam indispensáveis à consumação do delito de tráfico internacional, a minorante prevista no art. 33, §4º da Lei nº 11.343/2006 presta-se justamente a individualizar a culpabilidade dentre as diversas formas de realização do tipo do delito de tráfico. A causa de diminuição deve ser aplicada no patamar mínimo de 1/6 (um sexto).
  7. A sentença aplicou a detração para fins de fixação de regime inicial de cumprimento de pena, que foi mantido inicialmente fechado, ao fundamento de circunstâncias judiciais desfavoráveis. 8. Considerado o critério quantitativo da nova pena imposta, as circunstâncias do caso em tela e o réu não reincidente, pondero ser suficiente aos fins de reprimenda, que seja modificado o regime inicial de cumprimento de pena para o semiaberto, em atenção ao disposto no artigo 33, § 2º, “b”, do Código Penal.
  8. A substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos não se mostra suficiente no caso concreto, sendo certo, ademais, que não estão preenchidos os requisitos do artigo 44 do Código Penal.
  9. A detração, procedida em sentença, não alterou o regime inicial de cumprimento da pena, que já foi revisto para o regime inicial semiaberto e fica mantido.
  10. Apelação parcialmente provida, para alterar a fração de redução da atenuante da confissão espontânea para 1/6 (um sexto), aplicar a minorante prevista no art. 33, §4º da Lei nº 11.343/2006, no patamar de 1/6 (um sexto) e fixar a pena em 6 (seis) anos e 27 (vinte e sete) dias de reclusão, em regime inicial semiaberto, além do pagamento de 520 dias-multa, no valor unitário de 1/15 (um quinze avos) do salário mínimo.” (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, Ap. – APELAÇÃO CRIMINAL – 72290 – 0003196-24.2016.4.03.6005, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, julgado em 22/01/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/02/2018 ) grifo nosso

 

 

“PROCESSUAL PENAL E PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. PETIÇÃO FORMULADA PELA DPU. PRECLUSÃO. ASSOCIÇÃO PARA O TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. MODIFICAÇÃO DA SENTENÇA QUE CONDENOU OS ACUSADOS. ABSOLVIAÇÃO POR FALTA DE PROVAS. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. DOSIMETRIA DA PENA. REDIMENSIONAMENTO. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE.

  1. Não se conhece da petição da Defensoria Pública da União (DPU) intitulada “complementação de apelação”, eis que operada a preclusão em sua modalidade consumativa.
  2. Para a configuração do crime de associação para o tráfico previsto no art. 35 da Lei 11.343/2006 é indispensável a existência de vínculo associativo duradouro entre duas ou mais pessoas, firmado mediante acordo prévio, visando ao tráfico ilícito de drogas.

3.Não há prova convincente de que os acusados estariam associados para a prática do crime de associação para o tráfico de forma permanente. Pelas provas dos autos, o vínculo entre os acusados para a prática do crime foi transitório, caracterizando a hipótese de concurso de agentes.

  1. Sentença que condenou os acusados pela prática do delito previsto no art. 35 c.c art. 40, I, da Lei nº 11.343/2006 reformada. Absolvição, nos termos do art. 386, VII, do CPP.
  2. Crime transnacional de drogas. Materialidade e autoria comprovadas. O juízo ao fixar a pena-base levou em conta a quantidade individual da droga transportada/ingerida por cada um dos réus: 72 (setenta e duas) cápsulas, totalizando 1.049 g de cocaína; 78 (setenta e oito) cápsulas, totalizando 1.078 g de cocaína e 71 (setenta e uma) cápsulas, totalizando 1.004 g de cocaína, respectivamente.
  3. Dosimetria. Redução da pena-base de dois dos apelantes para o mínimo legal e, de outro, para 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa, haja vista ostentar maus antecedentes.
  4. Aplicação da atenuante da confissão espontânea (CP, art. 65, III, “d”). Incidência da Súmula 231 do STJ.
  5. Aplicação da causa de aumento de pena na fração de 1/6 (um sexto), tendo em vista que foi comprovado que a droga era proveniente do exterior (Bolívia).
  6. Aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, no patamar de 1/6 (um sexto), relativamente a um dos réus.
  7. Afastamento, de ofício, da agravante prevista no art. 62, IV, do Código Penal e da causa de aumento de pena prevista no art. 40, III, da Lei nº 11.343/2006.
  8. Fixado o regime semiaberto para início do cumprimento das penas privativas de liberdade.
  9. Não é cabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, por falta do requisito objetivo previsto no art. 44, I, do Código Penal.
  10. Recursos da defesa parcialmente providos.” (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Ap. – APELAÇÃO CRIMINAL – 70448 – 0000375-05.2016.4.03.6116, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO, julgado em 28/11/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/12/2017 ) grifo nosso

 

 

“PENAL. PROCESSO PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. ART. 33, CAPUT, E 40, I, DA LEI N.º 11.343/06. 6.239G DE COCAÍNA. AUTORIA E MATERIALIDADE DEMONSTRADAS. PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO § 4º, DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/06. REDUÇÃO EM 1/6. TRANSNACIONALIDADE. AUMENTO EM 1/6. REGIME INICIAL SEMIABERTO. INCABÍVEL A SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVAS DE DIREITOS. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. HC N. 126.292 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ESGOTAMENTO DAS VIAS ORDINÁRIAS.

  1. Materialidade e autoria demonstradas.
  2. A natureza e a quantidade da droga são critérios importantes para a fixação da pena inicial a ser aplicada ao crime de tráfico, conforme previsto no art. 42 da Lei n. 11.343/06. No caso, considerando que o acusado transportava 6.239g (seis mil, duzentos e trinta e nove gramas) de cocaína, é justificável a fixação da pena-base acima do mínimo legal, a qual mantenho em 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 666 (seiscentos e sessenta e seis) dias-multa, ante a ausência de recurso da defesa para reduzi-la.
  3. Ausentes circunstâncias agravantes e atenuantes.
  4. Na terceira fase, incide a diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/06, dado que estão preenchidos os requisitos legais cumulativos. Não há registro nos autos de que o réu possua antecedentes criminais, tampouco indícios satisfatórios de que integre efetivamente organização criminosa ou faça do tráfico de entorpecentes seu meio de vida, tornando possível identificá-lo como transportador ocasional. A fração de redução a ser aplicada no caso, porém, deve considerar as circunstâncias subjacentes à prática delitiva, consistentes, no fato de que a droga estava oculta em fundos falsos, dificultando, assim, a sua localização. A redução, por conta disso, será no mínimo de 1/6 (um sexto), do que resulta a pena de 5 (cinco) anos, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 555 (quinhentos e cinquenta e cinco) dias-multa.
  5. Considerando que a transnacionalidade do delito está demonstrada e é normal à espécie, bem como é a única causa de aumento aplicável dentre as previstas no art. 40 da Lei n. 11.343/06, mantenho o aumento em 1/6 (um sexto), perfazendo a pena definitiva de 6 (seis) anos, 5 (cinco) meses e 23 (vinte e três) dias e 647 (seiscentos e quarenta e sete) dias-multa, no valor unitário mínimo.
  6. Estabeleço o regime inicial semiaberto, consoante o disposto no art. 33, § 2º, b, c. c. o art. 59 do Código Penal.
  7. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, à míngua do preenchimento do requisito previsto no art. 44, I, do Código Penal.
  8. Em Sessão Plenária, o Supremo Tribunal Federal, em 17.02.16, firmou o entendimento, segundo o qual “a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal”.
  9. Em regime de repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal reafirmou o entendimento de que não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência (CR, art. 5º, LVII) a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau recursal, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário.
  10. A 5ª Turma do TRF da 3ª Região decidiu pela expedição de carta de sentença após esgotadas as vias ordinárias.
  11. Apelo parcialmente provido.” (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, Ap. – APELAÇÃO CRIMINAL – 71634 – 0006936-36.2016.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW, julgado em 20/09/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/09/2017 ) grifo nosso

 

 

Conforme se constata dos julgados acostados acima, todas as reduções provenientes do Tribunal Regional Federal da 3ª Região são em montante mínimo, 1/6, o que ofende o mandamento constitucional da individualização da pena. As ementas indicam quantidades e qualidades distintas de droga, que, portanto, deveriam merecer tratamento diferenciado na fixação da pena.

Como destacado, no caso em análise, a quantidade de droga supostamente transportada pela agravante é pequena (289,5 gramas de cocaína), pelo que deve ser conferida a ela redução mais generosa.

Outro argumento que deve ser refutado é o de que a percentagem escolhida da redutora decorreria da organização para tráfico internacional e sua movimentação. Mais uma vez, calha refutar tal fundamento, pois, as condições, as estruturas, os modos de se traficar, bem como o poderio das organizações, variam enormemente, o que também seria contraditório com a imposição de uma única fração. Além disso, a mula, reconhecida como pessoa que tem participação esporádica no negócio da organização, dela não fazendo parte, submete-se ao que lhe é imposto, não sendo raros documentários de televisão que mostram as ameaças sofridas por quem, após aliciado, tenta discordar de qualquer ordem.

Assim, se por um lado não faz jus a mula à redução máxima de forma apriorística por sua mera condição; por outro, a aplicação obrigatória da fração mínima é também incabível, por divorciar-se do caso concreto e da individualização da pena.

Portanto, deve ser provido o recurso para que seja concedida a ordem com a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, §4º, da Lei 11.343/06, em percentual maior, bem como de seus consectários, a saber, a substituição da pena e a fixação do regime correspondente.

Aos que me seguem

Aos que me seguem

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Aos que me seguem no Twitter, penso ser necessário dar uma explicação além da linguagem telegráfica da mencionada rede social.

Sou Defensor Público Federal, patrocinando as mais diversas causas, nas mais diferentes searas, em favor dos meus assistidos.

Especificamente na área criminal, já peguei casos em que se discutiam crimes graves e outros em que se discutiam crimes menos relevantes, sendo estes, aliás, a maioria.

Claro que quero vencer os processos que patrocino, mas, a diferenciação que farei a seguir é fundamental, como pessoa razoável que penso e pretendo ser: entendo perfeitamente que, em muitos casos, a decisão será contrária ao assistido da Defensoria. Isso é absolutamente normal e minhas reclamações não provêm daí.

Recebo inúmeras intimações a cada semana. Atualmente, na fase em que se encontra o STF, em minha opinião, a mais rigorosa nos meus 11 anos de atuação, boa parte das decisões são monocráticas e denegatórias.

Considerado esse número, quem acompanha minhas postagens no Twitter observa que reclamo de poucas decisões e, além disso, algumas negativas são apenas divulgadas, sem tom crítico.

Todavia, há decisões que me geram grande incômodo.

Já causariam em situação normal, mas ficam ainda pioradas quando vêm de Ministros que bradam no Plenário da Corte estarem preocupados com as prisões cautelares intermináveis, com o excesso de rigor na dosimetria penal, ou em favor da sacralidade do direito de defesa.

Além disso, o princípio da insignificância, que atinge justamente as condutas mais irrelevantes, torna-se cada vez mais restrito e cheio de condicionantes. São incontáveis os processos de descaminho de sacoleiros, os furtos de alimentos, roupas e produtos de higiene em que a bagatela é afastada pela vida pregressa, o que também parece contrariar o discurso libertário.

Acho que posso dizer ter conduta ética e equilibrada. Penso que os membros do Judiciário e do Ministério Público perante os quais trabalhei nesses 16 anos de carreira concordariam com minha afirmação.

Falando especificamente da Corte, por conduta equilibrada refiro-me à postura, à apresentação, às falas na tribuna, ao respeito ao STF e seus membros e também ao não insistir em recursos incabíveis, em temas consolidados, em tomar tempo dos Ministros com o que já foi dito e repetido.

Como mencionei acima, poderia abarrotar o Tribunal de agravos regimentais, o que tomaria meu tempo e o da Corte, sem qualquer chance de êxito. Não ajo assim. Recorro pouco. Brigo pelo que entendo ser razoável. Meus 11 anos de STF com mais de 100 sustentações orais proferidas mostram isso, penso eu.

Creio até ser respeitado, mas quero que meus assistidos tenham o tratamento que merecem. Não me presto a recursos absurdos, a manobras inadequadas.

Por isso fico realmente muito incomodado ao perceber que cada vez menos tenho (embora fale na primeira pessoa do singular, leia-se “DPU e assistidos”) chance de proferir sustentação oral e, ao que tudo indica, até mesmo os julgamentos presenciais, ao que parece, me serão negados.

Se é a mesma coisa, virtual e presencial, por que ao fazer uma rápida pesquisa pelo site eletrônico do STF, percebo que inúmeros HCs e RHCs de políticos e empresários têm sido julgados na forma presencial?

Nem me lembro, para dar um exemplo, qual foi a última vez em que o Ministro Gilmar Mendes colocou um habeas corpus da DPU para ser julgado no colegiado sem ser pela via do agravo regimental. Poderia indicar, no mesmo período, vários outros que foram levados.

Entendo a mudança de postura do STF ao julgar os habeas corpus de forma monocrática dado seu enorme volume. Todavia, há diversos processos da Defensoria que tratam de temas relevantes, ainda não sedimentados e com enorme capacidade de espraiar seus efeitos para muitos outros.

Aliás, também me incomoda a invocação do que ocorre em Cortes Constitucionais pelo mundo para justificar a limitação dos habeas corpus. Ora, se vamos comparar, pergunto: qual Tribunal estrangeiro julga tantas autoridades com prerrogativa de foro? Ah, mas o foro é previsto na Constituição. Concordo, mas o cabimento de habeas corpus o também é – além de sua importância histórica para a Suprema Corte brasileira.

Em suma, minha fala é pelo tratamento igualitário, próximo entre todos os que batem às portas do STF.

De minha parte, continuarei atuando com razoabilidade, respeitando as teses e o tempo do Tribunal, mas me insurgindo sempre que entender ter havido alguma injustiça. O dia em que perder minha capacidade de me indignar estará na hora de mudar de atividade.

Brasília, 27 de abril de 2018

Momento curioso

Momento curioso

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Em um dia pesado na 2ª Turma do STF, houve um momento que posso chamar de “divertido”, embora o final não me tenha sido favorável.

A sessão do dia 21 de março de 2017 começou pesada, como noticiaram amplamente os jornais[1] do país.

Após o início tenso, os processos começaram a ser julgados, com sustentações orais diversas, inclusive duas proferidas por meu colega.

Chegou a minha vez de sustentar em um habeas corpus em que se discutia a aplicação da causa de aumento de pena em tráfico de drogas quando a pessoa pratica a conduta perto de estabelecimento prisional sem, contudo, tentar se valer da situação para disseminar mais ainda os entorpecentes (HC 138944).

Após minha fala, votaram pela denegação os Ministros Dias Toffoli, relator, e Edson Fachin. Em seguida, o Ministro Ricardo Lewandowski começou a votar, dizendo que eu ficava tentando criar teses para convencer o tribunal a mudar seu entendimento. Ele falou de forma cortês, como, aliás, é típico dele. Esbocei um leve sorriso pensando: “claro, Ministro, senão como vou convencê-los?”. Ao ver que eu estava com uma cara de riso, ele então completou: “o Defensor sabe que estou falando a verdade, tanto que está sorrindo”. Nisso, os demais Ministros começaram a rir também da situação.

Foi curioso, principalmente em um dia tão pesado, em um ambiente tão formal como o STF.

A ordem foi denegada por unanimidade, infelizmente.

Semana que vem tem mais tese….

Brasília, 23 de março de 2017

 

[1] http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,gilmar-mendes-faz-criticas-a-vazamentos-de-conteudos-de-investigacoes-sigilosas,70001708494

Comparem com as notícias dos jornais

Comparem com as notícias dos jornais

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Não vou me cansar de colocar certas coisas aqui, mesmo que de nada adiante.

Vivencio o dia a dia do Supremo Tribunal Federal. Acompanho as sessões, as decisões, principalmente na seara criminal, as linhas adotadas por cada Ministro, vejo as notícias cobrando celeridade quanto às ações penais originárias.

Comento abaixo, telegraficamente, o HC 139738 do STF:

Furto simples.

Paciente primário, bons antecedentes.

Empregado.

Bem subtraído: roupa usada (um agasalho). Valor: R$ 99,00. Coisa restituída.

Conduta destituída de qualquer elaboração ou destreza especial.

O paciente foi sumariamente absolvido pelo Juízo de Primeiro Grau.

Interposta apelação pelo Ministério Público, ela foi provida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, por maioria. Opostos embargos infringentes, o TJMG rejeitou o recurso defensivo.

Em seguida, a defesa apresentou recurso especial, desprovido pelo Superior Tribunal de Justiça.

Impetrado habeas corpus perante o STF, o Ministro Edson Fachin, relator, negou-lhe seguimento monocraticamente.

Interpus agravo interno, que será julgado em lista, ou em sessão virtual, ou no meio de inúmeros outros…

Em linguagem bem popular: me deixa falar, STF! Negue meu pedido, mas me ouça. Ouça as pessoas a quem represento. Aprecie as razões pelas quais o TJMG proveu o recurso ministerial e diga que ele está certo, em caso de concordância, mas me deixe falar.

As comparações que faço há tempos, sobre o direito penal dos ricos e o dos pobres, estão sendo cada vez mais observadas por pessoas estranhas ao direito.

Um recebimento de denúncia de detentor de foro toma a tarde inteira da Corte, não custa ouvir a Defensoria Pública, STF, que fala, em cada HC, por centenas (milhares?) de pessoas.

Até quando o TJMG dirá que o princípio da insignificância não tem acolhida no ordenamento jurídico pátrio? Transcreverei abaixo trechos do voto condutor da apelação (Apelação Criminal 1.0024.10.269422-1/001, TJMG, Rel. Desembargador Agostinho Gomes de Azevedo, 7ª Câmara Criminal):

“O princípio da insignificância não encontra assento em nossa legislação, daí que sua aplicação pelo Poder Judiciário para fins de afastamento da tipicidade material implica em ofensa ao princípio da reserva legal, bem como ao princípio da independência entre os poderes, eis que estaria o Judiciário usurpando função inerente ao Poder Legislativo.”

Vou me dispensar de encher 3 laudas com precedentes do STF aplicando o princípio da insignificância em incontáveis feitos. Depois vêm a mim as perguntas sobre o excesso de habeas corpus que chegam à Suprema Corte. Prossigo com a citação:

“Agasalhar a tese em questão significaria tornar “insignificantes a MORAL, a ÉTICA, e os BONS COSTUMES”, fato que causaria verdadeira balbúrdia na ordem econômica e intranquilidade social (…)” (destaques no original)

É isso mesmo? O TJMG está certo? São condutas como um furto simples que atingem a ética e a moral? Queria ouvir o que tem a Suprema Corte a dizer.

Brasília, 19 de março de 2017

Duas dicas rápidas sobre habeas corpus

Duas dicas rápidas sobre habeas corpus

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Vão aqui duas dicas, aspectos corriqueiros, a respeito da impetração de habeas corpus, principalmente no que respeita ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal, que podem ajudar a quem começa a atuar na área.

A primeira delas é avisar que o enunciado da Súmula 691 do STF foi alargado. A citada súmula restringia a impetração de habeas corpus contra decisões que apenas indeferiram liminar na instância anterior, sem julgar o writ definitivamente. Atualmente, mesmo que a decisão monocrática seja definitiva e não mera cautelar, prevalece, de forma bastante pacífica no STJ e no STF, que não cabe HC contra ela, caso não tenha sido tornada colegiada pela via do agravo interno.

Em suma, o habeas corpus foi julgado de forma monocrática? Agrave, ou a chance do mérito do HC impetrado na Corte ad quem não ser apreciado é bem grande.

Há situações em que essa necessidade se torna completamente inadequada e contraproducente para a parte, principalmente, e também para os tribunais. Um exemplo ajuda a compreensão. Um Ministro do STJ denega um HC monocraticamente com base em jurisprudência consolidada da Corte Superior. O agravo interno terá o mesmo destino, certamente. Por outro lado, a linha adotada pelo STF é favorável ao paciente. Qual o sentido em se impor o agravo em casos como esse, bem comuns, aliás? Aumento de trabalho para todos. O recomendável é agravar, todavia.

Há pressa e o tema é bom? Faça o HC para o tribunal superior sem deixar de agravar da decisão singular. Dá mais trabalho, mas é o melhor caminho (ou, ao menos, o mais seguro).

Segunda sugestão. Indique na peça, expressamente, que deseja fazer “sustentação oral”. Alguns gabinetes de Ministros informam, mesmo sem esse pedido, a data do julgamento do writ, mas nem todos.

Certa vez, participei de uma reunião, juntamente com o então Defensor Geral Federal, com um(a) Ministro(a) do STJ que reclamou que havia pedidos de sustentação que depois não eram proferidas pelo impetrante.

Da minha parte é fácil explicar. A Defensoria Pública da União (DPU) impetra dezenas de habeas corpus com o mesmo tema. Não tenho como saber qual será julgado primeiro. Assim, quando um em que desejo falar é colocado em mesa, faço a sustentação e, na maioria das vezes, dou por encerrada a questão. Por outro lado, o ideal é sustentar antes de a matéria discutida ficar consolidada na Corte. Assim, os pedidos devem ser feitos em todos os HCs, em razão da eventualidade.

São dicas simples que podem ajudar a melhorar o aproveitamento e a chance de êxito dos habeas corpus.

Brasília, 18 de novembro de 2016

Um dia de luta

O e-mail abaixo transcrito foi enviado aos meus colegas Defensores Públicos Federais. Ele não contém nada de sigiloso ou que envolva a intimidade de qualquer assistido, pelo que pode ser lido sem restrições por qualquer um.

É o resumo de um dia extremamente cansativo, de lutas, reuniões, sustentação oral, presença no STF, mas igualmente satisfatório pela sensação não só de dever cumprido, mas da luta por uma causa de forma intensa e integral.

Ser Defensor não é fácil em uma série de circunstâncias, mas é extremamente gratificante na maioria delas.

A luta pelos mais fracos nunca é fácil, as vitórias fáceis não têm a menor graça.

Brasília, 16 de setembro de 2015

Gustavo de Almeida Ribeiro

Eis o e-mail:

Colegas, temos tido tantas atividades ultimamente que mal tenho conseguido comentar, mas algumas coisas, que nos dão satisfação e sensação de dever cumprido, eu gostaria de compartilhar com os colegas. Não por vaidade pessoal (talvez um pouco, sou humano – risos), mas principalmente por ver a DPU, problemas remuneratórios à parte, se firmar e ser reconhecida na marra, mesmo apesar das dificuldades que enfrentamos.

1.            Hoje, eu e o Dr. Haman estivemos na CNBB. Particularmente, saí muito satisfeito. Senti interesse por parte dos Bispos, que perguntaram, quiseram mais informações, deram sugestões. Pediram a nossa presença nas dioceses pelo país para o compartilhamento de apoio e atuação. Distribuímos material que tínhamos preparado com o apoio da Imprensa e da Keite Camacho, que hoje trabalha com o Antonio Ezequiel, contendo endereços, informações básicas e quatro processos relevantes no STF para eventual apoio da CNBB.

2.            Mais tarde fui para o STF sustentar o HC 128554, impetrado pela Tatiana Lemos (fico devendo os nomes dos demais colegas) em que se discutia a confirmação da presença do THC em pequena porção de maconha (2 gramas) apreendida com soldado que prestava serviço militar obrigatório para a configuração da materialidade do delito.

Estimulado pelas recentes discussões sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio, resolvi subir à tribuna para destacar os ainda maiores discrepância e anacronismo caso prevaleça o entendimento que vai se configurando majoritário no RE 635659 em relação ao ultrapassado artigo 290 do CPM.

Sustentação oral tem umas coisas curiosas e sou bem rigoroso comigo. Já teve dias em que ganhei e pensei: “é, foi bem mais ou menos”. Hoje perdi, mas notei que causei um constrangimento grande principalmente para os Ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello. O voto do Ministro Celso de Mello foi tão favorável, que quem perdeu a última frase achou que ele votou pela concessão da ordem (vi duas meninas comentando isso, aliás). Gosto disso. Prefiro ganhar, é claro, mas tirar os Ministros da zona de conforto e fazer um julgamento unânime com apoio em um precedente do Plenário se arrastar por boa parte da sessão sempre me deixa satisfeito. A DPU não aparece para cumprir tabela.

3.            Ultimou-se o julgamento do HC 126315 em que se questionava a consideração de maus antecedentes passado o período depurador de 5 anos, tal como ocorre na reincidência. A Ministra Cármen Lúcia levou voto-vista concedendo a ordem em menor extensão, no que foi acompanhada pelo Ministro Teori Zavascki. O Ministro Celso de Mello acompanhou os votos já proferidos pelos Ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli, sendo a ordem concedida por 3 a 2.

“Decisão: Após o voto do Relator, concedendo a ordem, no que foi acompanhado pelo Ministro Dias Toffoli, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista formulado pela Ministra Cármen Lúcia. Falou, pelo paciente, o Dr. Gustavo de Almeida Ribeiro, Defensor Público Federal. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Celso de Mello. 2ª Turma, 17.03.2015.”

“Decisão: A Turma, por votação majoritária, deferiu o pedido de habeas corpus para restabelecer a decisão proferida pelo TJ/SP nos autos da Apelação n. 0005243-89.2010.8.26.0028, no que diz respeito à quantidade de pena aplicada, e determinou, ainda, ao Tribunal de origem que, afastando o disposto no art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, proceda a nova fixação do regime inicial de cumprimento de pena, segundo os critérios previstos no art. 33, §§ 2º e 3º do CP, nos termos do voto do Relator, vencidos, em menor extensão, os Senhores Ministros Cármen Lúcia e Teori Zavascki, que deferiam parcialmente a ordem. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Dias Toffoli. Presidência do Senhor Ministro Celso de Mello. 2ª Turma, 15.09.2015.”

4.            Está na pauta do Plenário do STF para amanha o julgamento dos embargos de declaração no RE 855178 em que se discute a solidariedade no fornecimento de medicamentos. Nesse processo a luta foi tão grande, que após o resultado ele merece um e-mail próprio. O Antonio Ezequiel terminou agora à noite os memoriais e recebi, no final da tarde, e-mail da professora da USP, Sueli Dallari, contendo parecer assinado por diversos professores de várias áreas manifestando-se em favor da solidariedade. O contato insistente com a professora foi feito pelo Gustavo Zortéa. Assinam o documento, entre outros:

Sueli Gandolfi Dallari – Advogada, Professor Titular da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo; Coordenadora Científica do Núcleo de Pesquisa de Direito Sanitário da USP; Diretora Geral do Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário – CEPEDISA

Fernando Mussa Abujamra Aith – Advogado, Professor Doutor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Vice-Coordenador Científico do Núcleo de Pesquisa em Direito Sanitário da USP. Pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Direito Sanitário da Universidade de São Paulo / Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário – CEPEDISA

Dalmo de Abreu Dallari – Advogado, Professor Emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Direito Sanitário da Universidade de São Paulo / Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário – CEPEDISA

Helena Akemi Watanabe – Enfermeira, Professora Doutora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Direito Sanitário da Universidade de São Paulo / Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário – CEPEDISA

Paulo Roberto do Nascimento – Cientista social, Analista Sociocultural – Secretaria de Estado da Saúde/SP. Pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Direito Sanitário da Universidade de São Paulo / Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário – CEPEDISA

Transcrevo a conclusão:

“A competência comum, portanto, enseja a responsabilidade solidária e o dever de todos os entes federativos de cuidar da saúde dos cidadãos de forma universal e integral. Compreender a competência comum e a responsabilidade solidária de maneira diferente seria limitar o direito à saúde em evidente violação às determinações constitucionais. A competência comum para cuidar da saúde, determinada pelo Art. 23, II, da Constituição Federal, configura-se como um cláusula pétrea e fundamental para a proteção do direito social à saúde no Brasil, tal como reconhecido pelos Arts. 6o e 196 da Carta. Nenhuma norma infraconstitucional terá, jamais, o poder de limitar o direito do cidadão ou de coletividades específicas de exigir de qualquer dos entes federativos (inclusive dos três ao mesmo tempo) o cumprimento do dever estatal de garantia do direito à saúde.”

Ainda somos poucos e temos nossas limitações, mas estamos nos tornando adversários mais organizados e experientes.

Abraços,

Gustavo Ribeiro

 

Direito de intervir

Direito de intervir

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Comentário rápido que costumo fazer com amigos a respeito das sustentações orais: trocaria parte do meu tempo de tribuna, 15 minutos, na maioria das situações, pelo direito de tecer comentários em breves segundos após os votos dos Ministros ou a manifestação do Procurador da República.

Claro, após a sustentação, é possível rápida intervenção para esclarecimento de matéria fática, mas não é disso que se trata.

Já ouvi, após proferir sustentação oral perante o STF, algumas considerações invocando questões jurídicas – legislação ou jurisprudência – equivocadas, situação que acho normal, vez que ser humano algum sabe todo o ordenamento jurídico de seu país de cor. No entanto, seria consentâneo com a ampla defesa que certos comentários que não encontram esteio na jurisprudência tal como invocada ou na legislação pudessem ser indicados da tribuna.

Poderia citar alguns exemplos de que me lembro bem, mas ficarei com o último que ouvi. Certo Ministro falou sobre a aplicação de sursis em crime grave. Ora, não cabe sursis em crime grave, pelo que, como o antecedente não existe, menos ainda a consequência a que ele queria chegar como conclusão.

Nenhum dos demais Ministros falou nada a esse respeito e eu fiquei com a língua coçando, mas sabia que intervenção minha naquele momento, além de ser mal vista por todos, não mudaria o voto desfavorável.

Em outra vez, quando um Relator invocou jurisprudência já alterada, não resisti e apontei tal situação. Embora tenha sido informado de que só poderia falar dos fatos, usei a única frase que tinha antes de ser interrompido para simplesmente dizer que a jurisprudência tinha mudado. Deu certo. Um dos outros Ministros ouviu, pediu vista, juntei memoriais com a jurisprudência mais recente e o habeas corpus foi concedido. Confesso, entretanto, que dei sorte, pois se tal Ministro não estivesse prestando atenção, minha única frase antes de ouvir “Doutor, questão de direito, não pode” teria caído no vazio.

Por isso, trocaria, de bom grado, 5 minutos dos meus 15 de sustentação oral por 1 minuto para breves considerações sobre questões trazidas nos votos que, por vezes, destoam da legislação e da jurisprudência.

Quem sabe um dia seja assim!

Brasília, 10 de julho de 2015