Arquivo da tag: liberdade

Pedido de liberdade – atos de 08-01-2023

Pedido de liberdade – atos de 08-01-2023

Coloco, em anexo, excluindo os nomes, o pedido de liberdade apresentado pela colega Geovana Scatolino em favor dos assistidos da Defensoria Pública da União ainda presos (o processo agora é público).

É mais uma tentativa da DPU de obter a liberdade dessas pessoas, uma vez que já se passaram quase 6 meses dos atos e da prisão.

Conforme já esclarecido, não cabe habeas corpus contra ato de Ministro do STF, e o agravo depende de o próprio relator pautar o recurso para julgamento.

Seguimos na batalha.

Vale a leitura.

Gustavo de Almeida Ribeiro

Brasília, 31 de maio de 2023

Sobre a destituição da Defensoria Pública – ARE 1224170/STF*

Sobre a destituição da Defensoria Pública – ARE 1224170/STF*

 

Seguem abaixo, para leitura, o acórdão do STJ que manteve o afastamento da Defensoria Pública no caso tratado no ARE 1224170/STF, bem como o agravo interno apresentado pela DPU contra decisão monocrática da Ministra Rosa Weber.

Posteriormente atualizarei o post, esclarecendo melhor as coisas, mas o dia hoje é corrido.

Agravo no ED no RMS 51218 STJ

Agravo regimental – ARE 1224170

Gustavo de Almeida Ribeiro

Brasília, 29 de outubro de 2019

 

*Atualização – 1º de novembro de 2019

Respondo, abaixo, algumas das perguntas que recebi por telefone, whatsapp ou Twitter.

O crime do qual foi acusado o assistido da Defensoria foi um furto qualificado pelo concurso de pessoas, na forma tentada.  O bem sobre o qual incidiu a tentativa de furto foi um veículo Fusca (o carro foi restituído a seu dono).

O fato aconteceu em 2014.

O acusado foi solto em decorrência de HC impetrado pela Defensoria perante o TJPR.

Reitero o que já havia falado no Twitter: desde sua primeira oitiva, o acusado informou que estava em situação de rua.

Ao fixar a fiança em R$ 1448,00 (dois salários mínimos à época), o Juízo expressamente reconheceu:

A S de S “não tem outro registro criminal”

Adiciono a manifestação do MP quanto ao pedido de liberdade sem fiança:

Manifestação – fiança MP

Transcrevo agora trecho do parecer  ofertado pela Procuradoria de Justiça do MP do Paraná nos autos do Mandado de Segurança (excluí o nome do acusado):

“Em nenhum momento o réu A S de S esteve indefeso, qualidade atribuída pelo Juiz singular em sua decisão de fís. 98-TJ. Ao contrário, conforme bem posto por Vossa Excelência na r. decisão de fls. 106/107 destes autos, através da atuação de integrante da Defensoria Pública do Estado do Paraná, o processado obteve parcialmente a liminar nos autos de Habeas Corpus 1.216.790-1, reconhecendo o constrangimento ilegal suportado pelo processado quanto ao arbitramento de fiança, eis que demonstrado nos autos sua precária condição econômica. Diante de tais circunstâncias, foi determinada naquela oportunidade a revogação de sua prisão preventiva e concessão de liberdade provisória mediante de termo de compromisso nos autos.”

O caso da bicicleta de ouro – HC 151880/STF

O caso da bicicleta de ouro – HC 151880/STF

 

Espero ter tempo para comentar o caso com calma depois, mas como ele gerou interesse, divulgo abaixo as duas decisões monocráticas do Ministro Edson Fachin no HC 151880, bem como o agravo interno por mim elaborado.

O paciente foi condenado a 6 anos de reclusão por um FURTO QUALIFICADO TENTADO DE UMA BICICLETA.

Como se verifica da decisão, o paciente foi preso em 13/02/2017.

Brasília, 23 de abril de 2019

Gustavo de Almeida Ribeiro

Primeira decisão – HC 151880

Agravo Interno – HC 151880

Decisão no agravo – HC 151880

*atualização (25/04/2019)

Muitas pessoas me perguntaram da sentença que chegou à pena de 6 anos para um furto qualificado tentado de uma bicicleta. Assim, resolvi inseri-la no post.

Sentença – HC 151880

Reflexões sobre a pena de multa após as execuções penais da AP 470 e o julgamento da ADI 3150

Reflexões sobre a pena de multa após as execuções penais da AP 470 e o julgamento da ADI 3150

 

Segue, abaixo, trecho da petição de agravo interno que apresentei pela DPU ao STF no HC 165.726, em que se discute a possibilidade da concessão de indulto da pena de multa e qual o Juízo competente.

O tema é interessante em razão dos julgados recentes do STF em execuções penais oriundas da AP 470 (mensalão) e da ADI 3150.

Em meu sentir, entendimentos antigos ficaram superados, devendo o Supremo Tribunal adequar todos os julgados às consequências das teses por ele adotadas.

Aguardemos o que dirá a Segunda Turma do STF.

Gustavo de Almeida Ribeiro

Brasília, 4 de fevereiro de 2019

 

BREVE NARRAÇÃO DOS FATOS

O presente habeas corpus centra-se no constrangimento ilegal suportado pelo paciente, em decorrência de ter o Douto Juízo da Execução Penal deferido-lhe o indulto da pena corporal, com base no art. 1º, inciso XVI, do Decreto nº 8.615/2015, não o estendendo, todavia, à pena de multa, apesar do disposto no artigo 7º do mencionado Decreto. O fundamento invocado pelo Magistrado foi o entendimento segundo o qual seria incompetente para tanto, uma vez que a multa é executada perante o Juízo da Execução Fiscal.

Irresignada, a defesa interpôs agravo em execução, tendo o Tribunal de Justiça de Santa Catarina negado provimento ao recurso.

A defesa interpôs, então, recurso especial, ao qual foi negado provimento, pois o Superior Tribunal de Justiça entendeu competir ao Juízo da Vara de Execuções Fiscais a análise do pedido de indulto da pena de multa.

Inconformada, a Defensoria Pública da União impetrou habeas corpus junto ao Supremo Tribunal Federal com pedido de extensão do indulto à pena de multa e, por sua natureza penal, que fosse o pedido analisado pelo Juízo das Execuções Penais. Foi negado seguimento à impetração, sob a fundamento de impropriedade da via utilizada.

Data vênia, tal entendimento não deve prosperar, conforme será exposto a seguir.

 

DAS RAZÕES RECURSAIS

A Defensoria Pública da União ajuizou ação de habeas corpus perante o STF, por entender que o julgado emanado do Superior Tribunal de Justiça, com a devida vênia, incorreu em constrangimento ilegal em desfavor do paciente. O acórdão prolatado pela Corte Superior afirmou que a pena de multa tem caráter extrapenal, que se trata de dívida de valor e que a competência para sua cobrança não é do Juízo das Execuções Penais, que, portanto, não poderia indultar pena de multa. Transcreve-se, abaixo, a ementa da decisão impugnada:

“EXECUÇÃO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 66, II, DA LEI N. 7.210/1984. INDULTO. PENA PECUNIÁRIA. CARÁTER EXTRAPENAL. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA VARA DE EXECUÇÕES FISCAIS. 1. A Terceira Seção desta Corte assentou orientação de que a pena pecuniária é considerada dívida de valor e, assim, possui caráter extrapenal, de modo que sua execução é de atribuição exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública.

  1. Desse modo, não há falar em competência do Juízo das Execuções Penais para decidir a respeito do pedido do indulto à pena de multa convertida em dívida de valor, uma vez que, independentemente da origem penal da sanção, foi convolada em obrigação de natureza fiscal.
  2. Agravo regimental desprovido.” (AgRg no REsp 1694270/SC, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 16/10/2018, DJe 05/11/2018) grifo nosso

Ao negar seguimento ao writ, o Eminente Ministro Relator entendeu que a decisão combatida não seria contrária à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Cumpre, todavia, seja reanalisada essa assertiva.

Da superação da Súmula 693 do STF 

O habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública da União teve seu seguimento negado sob o fundamento de que a pena de multa imposta ao agravante não interferiria em sua liberdade de locomoção. Entretanto, tal tese não merece prosperar, segundo o atual entendimento esposado pela Suprema Corte.

O Plenário do STF firmou entendimento na linha de ser o inadimplemento da multa fator impeditivo para a progressão de regime. Calha, para ilustrar o afirmado, colacionar duas ementas de julgados no sentido mencionado:

“EMENTA: EXECUÇÃO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. PAGAMENTO PARCELADO DA PENA DE MULTA. REGRESSÃO DE REGIME EM CASO DE INADIMPLEMENTO INJUSTIFICADO DAS PARCELAS. POSSIBILIDADE. 1. O Supremo Tribunal Federal firmou orientação no sentido de que o inadimplemento deliberado da pena de multa cumulativamente aplicada ao sentenciado impede a progressão no regime prisional. Precedente: EP 12-AgR, Rel. Min. Luís Roberto Barroso. 2. Hipótese em que a decisão agravada, com apoio na orientação do Plenário do Supremo Tribunal Federal, condicionou a manutenção da sentenciada no regime semiaberto ao adimplemento das parcelas da pena de multa. 3. Eventual inadimplemento injustificado das parcelas da pena de multa autoriza a regressão de regime. Tal condição somente é excepcionada pela comprovação da absoluta impossibilidade econômica em pagar as parcelas do ajuste. 4. Agravo regimental desprovido.” (EP 8 ProgReg-AgR, Relator(a):  Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 01/07/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-213 DIVULG 19-09-2017 PUBLIC 20-09-2017) grifo nosso 

“ementa: Execução Penal. Agravo Regimental. Inadimplemento deliberado da pena de multa. Progressão de regime. Impossibilidade. 1. O inadimplemento deliberado da pena de multa cumulativamente aplicada ao sentenciado impede a progressão no regime prisional. 2. Tal regra somente é excepcionada pela comprovação da absoluta impossibilidade econômica do apenado em pagar a multa, ainda que parceladamente. 3. Agravo regimental desprovido.” (EP 12 ProgReg-AgR, Relator(a):  Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 08/04/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-111 DIVULG 10-06-2015 PUBLIC 11-06-2015) grifo nosso

Portanto, parece irrefutável que a pena de multa interfere de forma sensível no direito de ir e vir do cidadão, na medida em que impede um condenado de progredir de regime. Logo, a existência de multa pendente pode refletir na liberdade de locomoção, sendo tutelável, consequentemente, por meio do habeas corpus.

Da natureza penal da pena de multa 

Outro aspecto trazido pela r. decisão agravada foi que o descumprimento da pena de multa deságua em dívida ativa da Fazenda Pública, invocando-se, para tanto, a ementa do HC 85546, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, julgado pela 1ª Turma do STF.

Também esse fundamento sofreu alteração recente na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

Ficou assentado, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3150, que o Ministério Público é o principal legitimado para executar a cobrança das multas pecuniárias fixadas em sentenças penais condenatórias, sendo a atribuição da Fazenda Pública apenas subsidiária, em caso de inércia do MP.

Ademais, nessa mesma oportunidade, salientou-se que a multa pecuniária é sanção penal prevista na Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, inciso XLVI, alínea “c”), restando evidenciada a competência do Juízo da Execução Penal. Em razão de ser tal julgamento recente, o v. acórdão ainda não foi publicado. Cabe, todavia, extrair trecho do Informativo 927, publicado no sítio eletrônico do STF, na parte em que discorreu sobre o feito:

“O Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente o pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada em face do art. 51 do Código Penal (CP) (1) e, em conclusão de julgamento e por maioria, resolveu questão de ordem em ação penal no sentido de assentar a legitimidade do Ministério Público (MP) para propor a cobrança de multa decorrente de sentença penal condenatória transitada em julgado, com a possibilidade subsidiária de cobrança pela Fazenda Pública (Informativo 848).

O colegiado assentou que a Lei 9.268/1996, ao considerar a multa penal como dívida de valor, não retirou dela o caráter de sanção criminal que lhe é inerente, por força do art. 5º, XLVI, c, da Constituição Federal (CF) (2) (grifo nosso)

Como consequência, a legitimação prioritária para a execução da multa penal é do MP, perante a vara de execuções penais. Entretanto, caso o titular da ação penal, devidamente intimado, não proponha a execução da multa no prazo de noventa dias, o juiz da execução criminal deverá dar ciência do feito ao órgão competente da Fazenda Pública (federal ou estadual, conforme o caso) para a respectiva cobrança na própria vara de execução fiscal, com a observância do rito da Lei 6.830/1980. (grifo nosso)

O Plenário registrou que o art. 51 do CP, na redação que lhe havia sido dada pela Lei 7.209/1984, previa a possibilidade de conversão da multa em pena de detenção, quando o condenado, deliberadamente, deixasse de honrá-la. Posteriormente, a Lei 9.268/1996 deu nova redação ao dispositivo, referindo-se à multa como dívida de valor. Assim, a nova redação do referido dispositivo implicou duas consequências: i) não mais permite a conversão da pena de multa em detenção; e ii) a multa passou a ser considerada dívida de valor.

Contudo, dizer que a multa penal se trata de dívida de valor não significa dizer que tenha perdido o caráter de sanção criminal. A natureza de sanção penal dessa espécie de multa é prevista na própria CF, razão pela qual o legislador ordinário não poderia retirar-lhe essa qualidade. (grifo nosso)

Diante de tal constatação, não há como retirar do MP a competência para a execução da multa penal, considerado o teor do art. 129 da CF (3), segundo o qual é função institucional do MP promover privativamente a ação penal pública, na forma da lei. Promover a ação penal significa conduzi-la ao longo do processo de conhecimento e de execução, ou seja, buscar a condenação e, uma vez obtida esta, executá-la. Caso contrário, haveria uma interrupção na função do titular da ação penal.

Ademais, o art. 164 da Lei de Execução Penal (LEP) (4) é expresso ao reconhecer essa competência do MP. Esse dispositivo não foi revogado expressamente pela Lei 9.268/1996.

Vencidos os ministros Marco Aurélio e Edson Fachin, que reconheceram a legitimidade exclusiva da Fazenda Pública para promover a execução da multa decorrente de sentença penal condenatória transitada em julgado referida no art. 51 do CP.

O ministro Marco Aurélio afirmou que, ante a transformação legal em dívida de valor, consoante o dispositivo impugnado, a multa em questão deixou de ter conotação penal. Já o ministro Edson Fachin, apesar de assentar o caráter de sanção criminal da pena de multa em referência, reconheceu a atribuição da advocacia pública para iniciar sua cobrança perante o juízo de execução fiscal.

(1) CP: “Art. 51. Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição.”

(2) CF: “Art. 5º (…) XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: (…) c) multa;”

(3) CF: “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;”

(4) LEP: “Art. 164. Extraída certidão da sentença condenatória com trânsito em julgado, que valerá como título executivo judicial, o Ministério Público requererá, em autos apartados, a citação do condenado para, no prazo de 10 (dez) dias, pagar o valor da multa ou nomear bens à penhora.””

ADI 3150/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 12 e 13.12.2018. (ADI-3150)

AP 470/MG, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 12 e 13.12.2018. (AP-470)

Portanto, os julgados recentes da Corte Suprema, mencionados acima, demonstram estar superado o entendimento que culminou na edição da Súmula 693 pelo STF, em razão das consequências do inadimplemento da multa na execução da pena corporal. Também restaram consolidadas sua natureza penal e a competência para sua execução. Assim, deve ser enfrentado o mérito e concedida a ordem de habeas corpus em favor do agravante.

Extradição e Lei de Migração – contenciosidade limitada

Extradição e Lei de Migração – contenciosidade limitada

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

Uma reflexão interessante foi trazida pelo colega Gustavo Zortéa, integrante do grupo que atua pela DPU perante o STF: a recente Lei de Migração trouxe mitigação ao sistema de contenciosidade limitada da extradição?

Explico. Vigora nas extradições o entendimento no sentido de que o Supremo Tribunal Federal não ingressa na análise do caso em concreto para deferir ou não a entrega do requerido, apenas verificando se estão preenchidos requisitos previstos na Constituição, na Lei e no Tratado aplicável, como dupla tipicidade, não ter ocorrido a prescrição, segundo a lei mais favorável, a do Brasil ou a do Estado requerente, entre outros. Ou seja, o caso em si não é apreciado: se a pena foi alta ou não, se havia prova, se houve prisão processual indevida no país de origem, se o crime foi mais ou menos grave, são questões que não entram na discussão do pedido. Calha transcrever ementa que exemplifica o entendimento pacificado do STF:

“EXTRADIÇÃO INSTRUTÓRIA. DUPLA TIPICIDADE. DUPLA PUNIBILIDADE. PRINCÍPIO DA CONTENCIOSIDADE LIMITADA. PRESENÇA DOS DEMAIS REQUISITOS. LEI DE MIGRAÇÃO. TRATADO DE EXTRADIÇÃO ENTRE BRASIL E ARGENTINA. ACORDO DE EXTRADIÇÃO ENTRE OS ESTADOS PARTES DO MERCOSUL. DEFERIMENTO CONDICIONADO À ASSUNÇÃO DE COMPROMISSOS PELO ESTADO REQUERENTE. 1. Presentes a dupla tipicidade e punibilidade, bem como os demais requisitos previstos na Lei de Migração, no Tratado de Extradição entre Brasil e Argentina e no Acordo de Extradição entre os Estados Partes do Mercosul, não se verifica óbice ao deferimento da extradição. 2. Ao Supremo Tribunal Federal não é dado analisar o mérito da acusação ou condenação em que se funda o pedido de extradição, exceto se constituir requisito previsto na Lei 13.445/2017 ou no acordo de extradição, em razão da adoção pelo ordenamento jurídico pátrio do princípio da contenciosidade limitada. 3. A simples alegação de que a extradição importará risco à vida do extraditando não se presta a obstar o acolhimento do pedido, mormente pela inexistência de comprovação idônea de causa excepcional que legitime a recusa, bem como pelo fato de que a garantia da segurança do extraditando em seu território incumbe ao Estado requerente. 4. Pedido de extradição deferido e condicionado à assunção prévia pelo Estado requerente dos compromissos previstos no art. 96 da Lei 13.445/2017, dentre eles o de detração da pena e o de comutação da pena perpétua em privativa de liberdade, respeitado o patamar máximo de 30 (trinta) anos.” (Ext 1460, Relator(a):  Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 17/04/2018, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-082 DIVULG 26-04-2018 PUBLIC 27-04-2018)

Todavia, a Lei de Migração (Lei 13.445/2017) trouxe, em seu artigo 86, aspecto que pode significar mitigação ao princípio da contenciosidade limitada, ao determinar que, para a concessão de prisão domiciliar ou se permitir que o extraditando responda ao processo em liberdade, devem ser verificadas as circunstâncias do caso:

“Art. 86.  O Supremo Tribunal Federal, ouvido o Ministério Público, poderá autorizar prisão albergue ou domiciliar ou determinar que o extraditando responda ao processo de extradição em liberdade, com retenção do documento de viagem ou outras medidas cautelares necessárias, até o julgamento da extradição ou a entrega do extraditando, se pertinente, considerando a situação administrativa migratória, os antecedentes do extraditando e as circunstâncias do caso.” (grifo nosso)

Ora, como o requerido pode não ter processo nenhum em trâmite perante a Justiça brasileira, o caso que terá suas circunstâncias analisadas só pode ser aquele que gerou o pedido de extradição.

Aliás, a Lei de Migração, ao permitir expressamente a concessão de liberdade ao extraditando, mostra-se consentânea com a excepcionalidade da prisão cautelar, afastando entendimento anterior no sentido de ser obrigatória a prisão para extradição como condição de procedibilidade.

Não há sentido, por exemplo, em se manter presa pessoa acusada da prática de estelionato, crime praticado sem violência ou ameaça, que, muitas vezes, é punido no Brasil com penas restritivas de direito, a não ser que existam circunstâncias especiais que justifiquem o recolhimento cautelar, tal como previsto na norma atual.

Essa questão recente foi objeto de despacho feito pelo mencionado colega com o Ministro Alexandre de Moraes na Ext. 1535[1], sendo, em tal caso, deferida a liberdade à extraditanda, pelo que é pertinente transcrever trecho da decisão:

“As circunstâncias concretas do caso, notadamente tratar-se, em tese, de crime com pena máxima de dois anos de detenção (CP, art. 249); bem como os filhos menores terem regressado ao país de origem, sem qualquer notícia de maus-tratos enquanto estiveram com a mãe, autorizam, nos termos do art. 86 da Lei 13.445/17, que a extraditanda responda ao processo de extradição em liberdade.” (STF, Ext. 1535, Relator Min. Alexandre de Moraes, DJe 25/05/2018)

Assim, embora ainda vigore a contenciosidade limitada em se tratando de extradição, os Ministros do STF deverão analisar se o fato que dá ensejo ao pedido justifica ou não a imposição de prisão, o que não deixa de ser uma análise, ainda que pouco aprofundada, do caso em concreto, antes não prevista em lei.

Brasília, 5 de junho de 2018

 

[1] https://g1.globo.com/pa/para/noticia/dinamarquesa-detida-no-para-deve-recorrer-contra-pedido-de-extradicao.ghtml

O STF se arrependeu?

O STF se arrependeu?

 

Gustavo de Almeida Ribeiro

 

O Plenário do STF proferiu, em anos recentes, várias decisões importantes no que concerne ao tráfico de drogas. Cito algumas pertinentes ao que exporei no texto:

HC 97256 – permitiu a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos no tráfico de drogas;

HC 111840 – permitiu que o cumprimento de pena se inicie em regime mais brando que o fechado no tráfico;

HC 104339 – considerou inconstitucional a vedação à liberdade provisória no tráfico.

Todavia, em casos em que tenho atuado recentemente, a maioria deles emanados de Ministros da 2ª Turma do STF, que, desde que comecei a atuar na Corte, tinham visão mais favorável aos assistidos da Defensoria, o rigor tem crescido sensivelmente, sendo invocadas circunstâncias absolutamente normais ao tráfico de drogas para se repristinar as vedações absolutas afastadas nos julgados acima mencionados.

Quantidades pequenas de droga, seu acondicionamento, o fato de a pessoa ter corrido na hora da prisão, de ser cocaína, quase tudo tem impedido a substituição da pena, a concessão de liberdade ao acusado, a fixação do regime inicial aberto.

Poderia ficar aqui enumerando vários habeas corpus denegados monocraticamente tratando do tema em questão, mas vou me limitar àquele em que trabalho agora, o HC 146570, de relatoria do Ministro Celso de Mello, em que foi negada a substituição de pena no tráfico privilegiado para pessoa flagrada com 32,28g de cocaína. Bem, se acusado que preenche os requisitos cumulativos do §4º do artigo 33 da Lei 11.343/06 (tráfico privilegiado) não tem direito à substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, devo concluir que ela não existe mais, pois, simplesmente alegar que a pena substituída não é suficiente não é fundamento, com o devido respeito.

Pior, tais decisões são tomadas de forma monocrática (o último HC ou RHC da DPU julgado de forma colegiada pela 2ª Turma do STF sem a necessidade de agravo foi apreciado em agosto de 2017), o que impede a sustentação oral.

Na verdade, o que sinto é a volta da gravidade em abstrato, o que, na prática, iguala os desiguais, situação que foi sempre muito criticada antes das decisões do STF que abrem o texto. Estamos voltando ao que era antes, infelizmente.

Brasília, 15 de novembro de 2017